MERCADO DE AÇÕES

Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, ministros do STF.

Brasil lidera ranking internacional de supersalários

O pagamento de valores acima do teto constitucional do serviço público – que é de aproximadamente R$ 46,4 mil – põe 40 mil funcionários do Estado no grupo 1% mais rico da população brasileira. A constatação é de um estudo recém-publicado que comparou os chamados “supersalários” do setor público brasileiro com as práticas de um grupo de dez países. A classificação de vários auxílios como verbas indenizatórias, que formalmente não compõem o salário-base, permite o pagamento extrateto e sem a incidência de Imposto de Renda. Segundo o levantamento, o Brasil desembolsou R$ 20 bilhões em remunerações extrateto entre agosto de 2024 e julho de 2025. O montante é 21 vezes superior ao da Argentina, segunda colocada no grupo analisado. Os 53,5 mil beneficiados pelos valores extrateto no Brasil representam apenas 1,34% dos servidores analisados no país, mas o fenômeno – concentrado na magistratura, no Ministério Público e em carreiras jurídicas – compromete a imagem dos demais 98,66% do funcionalismo e evidencia como o Estado tem operado como veículo de concentração de renda. O estudo “Benchmark internacional sobre teto salarial no setor público” foi conduzido pelo pesquisador Sergio Guedes-Reis, da Universidade da Califórnia em San Diego, para o Movimento Pessoas à Frente e a República.org. Ele comparou dados do Brasil com Alemanha, Argentina, Chile, Colômbia, Estados Unidos, França, Itália, México, Portugal e Reino Unido. Os R$ 20 bilhões gastos com supersalários, o maior valor estimado até hoje de gastos públicos com remunerações acima do teto, correspondem a 716 mil vezes a mediana da renda nacional brasileira, estimada em R$ 28 mil anuais. A mediana representa o valor central que divide a população entre os 50% mais ricos e os 50% mais pobres. Na Argentina, onde há metade dos servidores com supersalários em comparação ao Brasil, o gasto equivale a apenas 25 mil vezes a mediana da renda nacional. No Brasil, os 53,5 mil servidores que recebem acima do teto constitucional contrastam com os números dos demais países. A Argentina registra 27 mil funcionários nessa condição. Os Estados Unidos contabilizam pouco mais de 4 mil servidores acima do teto. Nenhum outro país pesquisado ultrapassou 2 mil trabalhadores com supersalários. A Alemanha não tem registro de casos. Segundo Guilherme Cezar Coelho, fundador da organização República.org, o custo para o Estado pode ser bem maior. “Se aumentarmos a amostragem, o custo pode ser ainda bem maior, alcançando, possivelmente, R$ 40 bilhões, que é 40% do déficit fiscal previsto pelo governo neste ano”, alerta. O analista político da 4intelligence Ricardo Ribeiro afirma que se trata de uma clara distorção, que ocorre principalmente no Judiciário, e que o fenômeno não é atual: “É um problema que existe há bastante tempo, essa maneira de driblar a determinação constitucional de que o teto máximo de remuneração do servidor público é o salário do ministro do Supremo Tribunal Federal [R$ 46.366,19]”.  VEJA TAMBÉM: Moraes defende mais salário para juízes; Gilmar decreta um direito a menos para o cidadão Reforma administrativa propõe fim de privilégios e provoca reações do Judiciário Quase metade dos servidores do grupo 1% mais rico são juízes Graças às remunerações acima do teto constitucional, aproximadamente 40 mil servidores públicos integram o grupo 1% mais rico do país, com renda anual superior a R$ 685 mil em 2025. Quase metade desses servidores é da magistratura (são 19.933 juízes no 1% mais rico da população brasileira), e outros 8.446 são membros do Ministério Público. Há também 10.256 mil servidores do Executivo federal – e três quartos destes são integrantes de carreiras da Advocacia-Geral da União. Os restantes são do Poder Legislativo e outros. Há ainda aqueles que recebem mais de R$ 1,2 milhão anuais, o que os posiciona entre os 0,4% mais ricos do país. Mais de 9 mil servidores públicos da amostra analisada fazem parte desse grupo – quase todos juízes ou membros do Ministério Público. Segundo Ribeiro, da 4intelligence, apesar de algumas tentativas, o combate aos supersalários ainda não foi adiante em razão da influência corporativa do Judiciário, contrária a ajustes, e do constrangimento de parte do Congresso em defender o tema. Ele cita a recente proposta de reforma administrativa do deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), que ainda não avançou no Congresso. O presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) afirmou no início do mês que pretende acelerar o rito de votação da proposta e levá-la diretamente para o plenário. “Do ponto de vista regimental, não tem nenhum prejuízo. O que nós temos que ter é condição política mesmo para aprovar. É o que estou sentindo com as lideranças”, disse ao sair de um evento sobre segurança jurídica. A revisão dos benefícios conta com amplo apoio popular: 83% da população defende uma regulamentação efetiva dos supersalários e o resgate da autoridade do teto constitucional, conforme pesquisa de opinião feita pelo Datafolha em julho. Moraes defende aumento de salários para juízes  No início de dezembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes defendeu que integrantes do Judiciário não devem ter vergonha de pleitear remuneração “mais digna”. As declarações foram proferidas durante o 19.º Encontro Nacional do Poder Judiciário e fizeram com que o ministro fosse aplaudido pela plateia. Moraes argumentou que defender benefícios por tempo de serviço não é corporativismo, mas garantia institucional. A medida possibilitaria a permanência dos quadros mais capacitados na magistratura, evitando que migrem para cargos de consultor na Câmara ou no Senado, onde podem advogar. Na visão do ministro, é injusto que um servidor iniciante ganhe o mesmo que alguém com 40 anos de carreira.  De acordo com o estudo do Movimento Pessoas à Frente, a magistratura responde pela maior parcela dos supersalários: ao todo, foram R$ 11,5 bilhões destinados a cerca de 21 mil juízes que recebem acima do teto: 79,9% dos magistrados do país. Entre agosto de 2024 e julho de 2025, quase 11 mil juízes brasileiros embolsaram mais de US$ 400 mil (em paridade de poder de compra – PPP), o equivalente a R$ 1 milhão. O valor supera a remuneração paga a qualquer magistrado em sete dos