Os estilhaços do tarifaço de Trump – 12/07/2025 – Alexandra Moraes – Ombudsman

Caricatura de Donald Trump expelindo gás pela boca.

A bomba tarifária de 50% com a qual Donald Trump resolveu chantagear o Brasil para defender o réu Jair Bolsonaro (PL) e as big techs já fez estrago direto e indireto em vários setores. No jornal não foi diferente. Leitores reclamaram da demora da Folha para colocar no ar um editorial que condenasse a medida.

A cobrança decorreu, ao menos em parte, da agilidade e dos termos severos do editorial do Estado de S. Paulo. Poucas horas após o anúncio do tarifaço, no feriado paulistano do 9 de Julho, o concorrente já estampava seu “Coisa de mafiosos“: “Que o Brasil não se vergue diante dos arreganhos de Trump. E que aqueles que são verdadeiramente brasileiros não se permitam ser sabujos de um presidente americano que envergonha a democracia”.

É compreensível, por um lado, que a Folha tenha aguardado um quadro um pouco mais consolidado da situação. Mas, também compreensivelmente, o contraste irritou assinantes.

“Aguardei ansiosamente o editorial de capa da edição de hoje, em defesa da soberania nacional, aviltada pelo governo Trump com a imposição desse tarifaço (…). Seu silêncio é uma vergonha, Folha“, escreveu um assinante sobre a edição da quinta-feira (10).

“Cancelei minha assinatura da Folha! Abrir o jornal e ler sobre a carta do Trump e não ver um editorial rebatendo este absurdo trumpista foi a gota d’água! (…) Lê o editorial do Estadão, o jornal que carrega a fama de ser de direita!!! Tô assinando ele hoje”, afirmou outra (agora ex) leitora.

No final da manhã da quinta (10) e na capa do impresso de sexta (11), o jornal levaria ao ar seu editorial “Chantagem rasteira de Trump não passará“. Apesar do atraso, também vinha com termos duros e cobrança ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), diante da liderança paulista no potencial de perdas.

A imagem de Tarcísio vestindo o boné do slogan trumpista, publicada pelo governador nas redes sociais em janeiro, se multiplicou como vírus após o tarifaço. Seu endosso ao bolsotrumpismo gerou assunto e questionamento.

Um assinante escreveu para comentar a quantas anda o “tarcisômetro” do jornal. “Na edição de sábado (12), tem um detalhe curioso: o nome ‘Tarcísio’ aparece em SETE títulos de textos. Todos negativos. (…) Os holofotes em Tarcísio claramente me parecem um azedume com sua hesitação em se desvencilhar do bolsonarismo e salvar São Paulo da maluquice de Trump. Antes tarde do que nunca.”

Outro leitor, no entanto, manifestou incômodo com a repetição do nome do governador. “Um estrangeiro pensaria que o presidente do Brasil é o Tarcísio de Freitas, e não o Lula, ao ler a Folha. Todos os dias opiniões dele, artigos repetindo as coisas que ele diz para tentar capitalizar politicamente o evento.” Ele enquadra o jornal: “Se a opinião de um governador é tão importante, exijo a cobertura detalhada de todos os 27 governadores”. A ideia cabe ao menos aos do Sudeste, região responsável por 70% das exportações para os EUA. Que tal?

Nessa mesma linha, mais um leitor cobrou uma espécie de quem é quem na bomba tarifária. Faria sentido mesmo reunir o que cada um disse e desdisse ao longo dos últimos dias. Outros governadores que se alimentam do vácuo de Bolsonaro e demais políticos pendurados na agenda que Trump usou para justificar o tarifaço também precisariam sair da toca.

Tomemos a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados. Na própria quarta (9) do anúncio de Trump, julgou de bom tom aprovar uma “moção de louvor e regozijo” ao presidente dos EUA.

Na tarefa de dar nomes aos bois, o Estado de S. Paulo exibiu a lista dos deputados que aprovaram o requerimento de Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), aliado de Bolsonaro. A Folha noticiou a aprovação, mas sem o cara-crachá.

Votaram a favor da moção de louvor a Trump: Alexandre Ramagem (PL-RJ), Filipe Barros (PL-PR), General Girão (PL-RN), Gustavo Gayer (PL-GO), Jefferson Campos (PL-SP), Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), Zucco (PL-RS), Carla Dickson (União-RN), Dr. Fernando Máximo (União-RO), José Rocha (União-BA), Rodrigo Valadares (União-SE), David Soares (União-SP), Claudio Cajado (PP-BA), Dilceu Sperafico (PP-PR), Evair de Melo (PP-ES), Dr. Frederico (PRD-MG), Osmar Terra (MDB-RS), Luiz Nishimori (PSD-PR), Sargento Fahur (PSD-PR), Reinhold Stephanes (PSD-PR), André Fernandes (PL-CE), Marcel van Hattem (Novo-RS), Silvia Waiãpi (PL-AP).

O Estado ainda relatava que “Fausto Pinato (PP-SP) [foi o] único parlamentar não petista a dar voto contrário. Integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Pinato afirmou que a reação do Brasil ao tarifaço é uma questão de soberania nacional, e não de ideologia”.

Há, porém, um aspecto mais sutil que ainda é mal explorado na cobertura. Ele aparece em títulos como “Números desmentem Trump e mostram que EUA têm superávit na relação com Brasil”. O material é correto, mas desconsidera um ponto fundamental: na narrativa trumpista, os dados da realidade costumam ser, no máximo, secundários.



Fonte ==> Folha SP

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