Se como pai eu fosse avaliado à maneira de um CEO, por um conselho administrativo, é provável que eu já tivesse sido defenestrado há uma data. Não possuo algumas características que suponho serem necessárias para o cargo.
E não falo de capacidade de liderança, mas simplesmente de ter uma palavra, um provérbio, um conselho matador para as muitas situações que as aflições do crescimento –tenho filhas de 20 e 17 anos– pedem.
Por outro lado, o jogo de dados genético fez com que elas já saíssem de fábrica com algumas características que nem o melhor ou o pior pai do mundo, se isso houvesse, seriam capazes de mudar.
E eu dei sorte: para ficar apenas num aspecto, elas têm moral hipertrofiada, ao menos se comparada à minha.
Pareço blasé, mas sujeitos céticos, descrentes, no limiar do niilismo, são bastante afetados pela síndrome do impostor. Mas, de fato, gostaria de legar a elas algo mais do que esse laissez-faire modorrento, um gestual mais caloroso, histórias edificantes e, sim, alguns provérbios.
Provérbios saíam fáceis da boca da minha mãe. Ela falava muito, e com convicção, do respeito que deveríamos devotar ao próximo; mas ocorre-me outro provérbio, de que gosto particularmente, “a lã não pesa ao carneiro”, usado para nos convencer, a mim e a meu irmão, a levar um casaquinho ao sair de casa.
Certa vez ouvi o finado psicoterapeuta Flávio Gikovate dizer na CBN que mais valia a rigidez à leniência, ele não deve ter usado essa palavra, na educação dos filhos. Se isso me marcou, não mudou minha conduta.
Talvez algumas broncas façam ou tenham feito falta, mas para dá-las eu teria de enfrentar uma crise de identidade ainda mais severa.
Mas como dar broncas em quem te chama de “pai”, “papai”, “painho”? Há título honorífico maior? Que Grã-Cruz, que “sir” supera isso?
Ainda hoje, se me ponho a pensar no assunto, me espanto e principalmente me enterneço ao perceber que entendo, com tanta naturalidade, que quando elas usam esse vocativo, pai, é a mim que estão a chamar.
E ainda acham que cabe um presentinho no domingo?
Alguns leitores foram muito gentis e generosos ao responder com seriedade e sem qualquer ceticismo à pergunta apocalíptica sobre o clima que formulei na minha última coluna. Gostaria de agradecer a Paloma Fonseca, que anda a pé, bike e ônibus e, quando usa aplicativo, prefere os carros elétricos, mesmo que pague mais por isso; e a Miguel Tanus Jorge, que não come carne vermelha e prefere alimentos orgânicos.
Agradeço ainda a Ivo Mutzenberg, Fernando Lima, Johnny Daniel e Tadeu Santos, que reconhecem a emergência climática; e especialmente ao serralheiro do Ipiranga Luiz Oliveira, que entrou em contato por e-mail para apresentar o artefato que criou.
Trata-se de um ralo de pia, “válvula de drenagem”, como disse, especialmente desenvolvido para restaurantes. O artefato ajuda a evitar entupimentos causados por restos de comida, o que, segundo ele, pode auxiliar no controle de desperdícios.
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Fonte ==> Folha SP