Quando chega a maturidade dos homens? – 01/10/2025 – Amor Crônico

Um grupo de homens está reunido em um ambiente interno, levantando copos em um brinde. Eles estão em um espaço moderno, com paredes decoradas e uma grande janela ao fundo que mostra uma paisagem verde. O grupo é composto por diversas idades e estilos de roupas, e todos parecem estar se divertindo. O ambiente tem um sofá vermelho e algumas poltronas azuis.

O incômodo diante da suposta eterna imaturidade emocional masculina atravessa gerações de mulheres, que repetem queixas ligadas à falta de diálogo, comprometimento e responsabilidade. Mas, a exaustão frente à repetição da evitação deles, costuma alimentar outra repetição feminina igualmente destrutiva: as muitas generalizações compartilhadas com a analista, as amigas e redes sociais… Mas raramente transformadas em implicação mútua do casal.

O que poderia ser articulado em diálogo privado, como atrito necessário à construção de saídas conjuntas (ainda que cada um siga para um lado), converte-se em espetáculo de julgamento e condenação pública. A crítica, embalada em catarse coletiva, produz efeito rebote, cristaliza traumas e aumenta a desconfiança.

A repercussão do reality “Casamento às cegas 50+“, da Netflix, não apenas escancarou a imaturidade de pessoas supostamente maduras, como também revelou o prazer que temos em nos colocar como avaliadores externos ao invés de nos implicarmos na análise de nossas próprias vidas amorosas.

De maneira simplista e maniqueísta tiramos conclusões e traçamos perfis caricatos. Seríamos tão imaturos quanto os que acusamos? O subtítulo afirma que “nunca é tarde para amar”. Mas a questão incômoda permanece: e para amadurecer, será que já não estamos todos atrasados?

Maturidade emocional não vem com o tempo. Pelo contrário, no amor, nossa experiência muitas vezes depõe contra nós e o que chamamos de “capacidade analítica de prever roubadas afetivas” na verdade são ecos de viés de confirmação, medos silenciados e fadiga crônica fruto de relações anteriores. Estamos todas e todos exaustos, cheios de certezas e defesas e, ao mesmo tempo, jurando que queremos finalmente achar alguém com quem valha a pena amar. O senso comum diz que está cada vez mais difícil se relacionar. “Eles não crescem, elas exigem demais…” o inferno são os outros já diria Sartre. Mas qual é a parte que nos cabe nesse latifúndio?

Freud nos ensinou que todo sintoma é uma solução precária para o conflito psíquico. O que parece imaturidade tardia, em homens de 50 ou 60 anos, não é ausência de desenvolvimento, mas recusa de se implicar. Fugir do diálogo, terceirizar a culpa ou atacar é mais fácil do que reconhecer incoerências, escolhas e mudanças de opinião.

Muitos foram educados sem letramento afetivo, pressionados por um ideal de eu seguro e potente. Aos 50, deparam-se com a falência desse ideal, trazendo à clínica angústia e sensação de fracasso. Duvidam de si, dos outros, do mundo mas ainda assim querem um amor diferente sem perceber que seguem agindo de igual à pior se comparados com suas próprias versões adolescentes. Isso porque ao invés de se implicarem com os efeitos das experiências trazidas pelos anos de vida —traumas, fragilidades e incoerências— os mesmos os usam como justificativa, lente distorcida ou escudo. Nenhuma experiência passada justifica a evitação e o descaso presentes.

Infelizmente os comportamentos masculinos mais comuns ainda são fechar-se em silêncio, adotar ironias e distâncias frias, se esconder atrás de mensagens dúbias ou, pior, atacar a mulher culpando-a não só pelas situações como pelo seu próprio sentir. Repetidamente punem a suposta insegurança feminina como estratégia para esconder a própria.

Assim, presos num jogo onde um se coloca contra o outro para determinar quem é o culpado, adiam o movimento necessário para crescer e conviver em sociedade: Trocar a culpa pela responsabilidade é ter coragem de assumir não só a consequência dos atos, mas também os medos, as ambivalências, sentimentos e confusões. É parar de levantar a bola para que as mulheres cortem pois, como bons meninos imaturos, muitos marmanjos seguem testando os limites alheios como ato de rebeldia e egoísmo.

Na maioria dos cenários, esperam que a mulher tome todas as atitudes, o que revela não só a incapacidade de se responsabilizar pelos próprios atos, mas também a manutenção de uma estratégia que os poupa do desgaste do diálogo e também se propõe preservar o verniz de “homem desconstruído, que foi à análise e agora, aos 50, é um cara legal”. Talvez mais do que o medo do confronto, o que exista aqui nesses homens é o medo de quebrar o ideal de eu. De ser visto como um cara babaca, confuso, inconsequente. Ao tentar preservar o ideal de eu, fogem da castração e caem na armadilha de tornarem-se prisioneiros da própria defesa: é o medo de parecer infantis que os faz encenar, justamente, a caricatura de imaturidade que pretendiam negar.

Há, porém, uma dimensão relacional. Muitas mulheres alimentam esse circuito quando, por medo de perder a relação, silenciam incômodos e ocupam posições de mãe ou de eterna namorada adolescente. Sustentam vínculos em nome da família ou do ideal de casal, mas ruminam ressentimentos em silêncio. Essa ruminação é tão nociva quanto a fuga masculina: inventamos teorias, confirmamos preconceitos, transformamos o outro em lobo mau e a nós em Chapeuzinho. Generalizações fáceis como “todos os homens são adolescentes” soam empoderadoras, mas mantêm os vínculos aprisionados em estereótipos.

Maturidade é um exercício partilhado. Amadurecer é suportar a ambivalência: para os homens, renunciar ao ideal de si sempre seguro e desejável; para as mulheres, validar sentimentos e desconfortos sem esperar autorização externa. O erro não está em se incomodar, mas em calar ou transformar o incômodo em julgamento e sentença, sem direito de resposta. Quando o validamos e compartilhamos, implicamos o outro na construção de um caminho comum.

Explicar sem atacar, ouvir com coragem, aceitar diferenças, perguntar mais e supor menos: eis gestos de maturidade. O conflito não é destrutivo por si; pode ser lugar de lapidação. Relações não crescem pela ausência de atrito, mas pela capacidade de atravessá-lo com afeto.

Eles crescem? Alguns, quando enfrentam traumas e sustentam vulnerabilidades. Mas a pergunta mais provocativa talvez seja: e nós, crescemos? Porque, se seguimos silenciando incômodos, ocupando posições maternas ou nos refugiando em generalizações, continuamos todos jogando o mesmo jogo adolescente. Talvez a questão não seja apenas se “eles crescem”, mas se cada um de nós está disposto a crescer dentro da relação.

E se você também tem um dilema ou uma dúvida sobre suas relações afetivas, me escreva no colunaamorcronico@amorespossiveis.love. Toda quarta-feira respondo a uma pergunta aqui.



Fonte ==> Folha SP

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