Reino Unido precisa obter todo o crescimento que puder – 28/10/2025 – Martin Wolf

Mulher de cabelos castanhos e médios fala em púlpito com microfone preso à roupa. Fundo vermelho exibe texto branco parcialmente visível com a palavra

Por que se tornou tão difícil governar com sucesso as democracias ocidentais? “É a economia, estúpido”, como disse James Carville durante a campanha presidencial de Bill Clinton em 1992. Ele se referia ao que importa para os eleitores. Mas a frase também vale para a própria democracia.

As pessoas se importam com seu padrão de vida. A democracia é muito mais sólida quando todos podem prosperar. O crescimento econômico torna isso possível. O sufrágio universal nasceu do crescimento econômico moderno ou, mais precisamente, da nossa capacidade cada vez maior de produzir bens e serviços que as pessoas desejam. O crescimento foi o alicerce da democracia, e continua sendo até hoje.

Um país em que isso está especialmente evidente é o Reino Unido. A economia britânica está praticamente estagnada. Tornou-se uma economia de “soma zero”: o ganho de uns implica perda de outros. Politicamente, é quase impossível administrar uma situação assim.

O problema mais imediato é fiscal: o governo quer reduzir o déficit, manter seus compromissos de gasto e, ao mesmo tempo, evitar o aumento de impostos. Infelizmente, essa combinação é inviável em uma economia de baixo crescimento. Para piorar, uma previsão mais realista de produtividade do Escritório de Responsabilidade Orçamentária indica que a “margem fiscal” da ministra das Finanças, Rachel Reeves, deve desaparecer. Ela terá de fazer escolhas difíceis no Orçamento de novembro.

A situação do Reino Unido deve ser entendida no contexto mais amplo da história do crescimento econômico e da produtividade das grandes economias ocidentais desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Até meados dos anos 1970, o mundo viveu um superciclo de expansão: entre 1950 e 1974, o crescimento médio anual do PIB per capita foi de 4,9% na Itália, 4% na França, 2,7% no Reino Unido e 2,4% nos EUA, chegando a ser ainda maior no Japão.

Esses índices foram suficientes para proporcionar fortes aumentos no padrão de vida. De 1974 a 2007, o crescimento desacelerou significativamente no Japão e na Europa continental, mas manteve-se vigoroso. No Reino Unido, mal caiu, para 2,3%, o mesmo ritmo dos EUA.

Desde a crise financeira de 2007-2008, porém, a tendência mudou drasticamente. O crescimento médio anual do PIB per capita no Reino Unido foi de apenas 0,7%. Nos demais países do G7, ficou abaixo de 1%, exceto nos EUA, onde atingiu 1,5%. Na Itália, praticamente zerou.

Em suma, houve uma forte desaceleração do crescimento econômico nas grandes democracias de alta renda desde a crise financeira, com os EUA como exceção parcial. O mesmo vale para duas medidas de produtividade: o PIB por hora trabalhada e a taxa de crescimento da produtividade total dos fatores (PTF). No Reino Unido, a taxa média de crescimento do PIB por hora trabalhada entre 2007 e 2025 foi de apenas 0,5%, à frente apenas da Itália (0,2%) e da França (0,4%).

A PTF é o “resíduo inexplicado” do crescimento, após se medir as contribuições de capital e trabalho. É, portanto, um indicador de inovação. Entre 2007 e 2025, o crescimento médio anual da PTF foi negativo em todos os países do G7, exceto nos EUA. Esses números são dramaticamente inferiores aos registrados entre 1951 e 1974 e, na maioria dos casos, também aos de 1974-2007. Eles sugerem que a taxa de inovação atingiu o auge em meados do século 20 e caiu acentuadamente nas economias ricas desde então, como argumentou Robert Gordon em “The Rise and Fall of American Growth”.

Sem um crescimento mais rápido, políticos de países como o Reino Unido e a França enfrentam um dilema cruel: cortar gastos que a população considera essenciais, aumentar impostos que os contribuintes sentem não poder pagar, ou permitir uma escalada explosiva da dívida pública. Esse é, em poucas palavras, o impasse de Reeves.

A prioridade máxima deve ser obter todo o crescimento possível. Se houver uma retomada rápida e ampla da produtividade, ela provavelmente virá da inteligência artificial. É inevitável, no entanto, que isso acelere a “destruição criativa” —tema, aliás, do Prêmio Nobel de Economia deste ano. Grande parte dessa destruição recairá sobre empregos.

Para lidar com isso, o Reino Unido precisa se aproximar do modelo dinamarquês de “flexigurança”, permitindo que empresas demitam, mas amparando os trabalhadores na busca por novas oportunidades. Deve abandonar tentativas de tornar o mercado de trabalho mais rígido —empresas não contratam se não puderem demitir.

Crescimento mais rápido exige abraçar a mudança. A reforma do planejamento urbano precisa, de fato, sair do papel. O país também precisa criar uma economia de startups mais dinâmica, com novas empresas apoiadas para se tornarem líderes globais. As universidades devem ter papel central nesse processo.

Outro ponto crucial é reduzir o alto custo da eletricidade no Reino Unido. E, sobretudo, aumentar o investimento: o país tem a menor taxa de investimento entre as grandes economias avançadas —média de apenas 17% do PIB entre 2007 e 2025. A taxa de poupança nacional é ainda menor, de 14%, o que o torna fortemente dependente de poupança estrangeira. Reformas radicais no sistema de previdência serão essenciais para elevar as taxas de investimento e poupança.

A consolidação fiscal exigirá aumento de impostos. Na ausência de cortes significativos nos gastos —politicamente inviáveis—, os tributos terão de subir. As promessas eleitorais de não elevar o imposto de renda e o IVA precisam cair por terra. O Partido Trabalhista prometeu, de forma ingênua, não “aumentar impostos sobre os trabalhadores”. Mas o aumento das contribuições patronais para o seguro nacional no Orçamento de 2024 foi justamente um imposto sobre os trabalhadores. Reeves acredita que ele recai apenas sobre os patrões?

Se a carga tributária tiver de subir, a estrutura do sistema também precisa ser aprimorada. Felizmente, ele está tão confuso que uma reforma radical é ao mesmo tempo possível e benéfica. Voltarei a esse tema.



Fonte ==> Folha SP

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *