A construtora portuguesa Mota-Engil irá construir o túnel imerso Santos-Guarujá. A empresa venceu o leilão, realizado na tarde desta sexta-feira, 5 de setembro, na sede da B3, em São Paulo. Com 1,5 quilômetro de extensão, dos quais 870 metros construídos abaixo do canal do porto, será a primeira obra do tipo no País, com previsão de entrega em 2031.
A empresa ofereceu um desconto de 0,5% sobre a contraprestação pública anual, que ela terá direito a receber. Originalmente, o valor no edital era de R$ 438,8 milhões. Com o desconto, agora ela irá receber R$ 436,10 milhões por ano. Concorrente no leilão, a espanhola Acciona ofereceu zero de desconto.
Ao todo, a obra irá custar R$ 6,8 bilhões. Desse volume, R$ 5,1 bilhões serão divididos entre os governos estadual e federal. O restante será aportado pela empresa vencedora. A Mota-Engil também terá o direito de arrecadar receita a partir de cobrança de pedágio, prevista para R$ 6,15 para automóveis, R$ 3,07 para motocicletas e R$ 18,35 para caminhões.
A Mota-Engil tem como acionista a gigante chinesa de infraestrutura CCCC, responsável no Brasil pela construção da ponte Salvador-Itaparica. A obra é bandeira do atual ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), ex-governador da Bahia e responsável pelo novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de onde virão os recursos federais para o túnel do maior terminal portuário da América Latina.
Nos corredores da B3, antes do início do leilão, o que se comentava era que a participação da Acciona tinha mais o objetivo de garantir que não houvesse apenas uma participante na disputa. Entre as lideranças políticas, a avaliação era de que a empresa espanhola daria prioridade à construção da Linha 6-Laranja do Metrô, que ligará a estação São Joaquim, no Centro, a Brasilândia, na Zona Norte.
Para que o certame pudesse ser efetivado, foram necessário ajustes e discussões entre os governos, em alguns casos com a arbitragem do Tribunal de Contas da União (TCU). O principal entrave tratava de quem seria o dono do equipamento após o fim do prazo de concessão, de 30 anos.
Após reunião em Brasília, ficou definido que o túnel passaria a ser de propriedade da União. No início da semana, o Ministério Público do TCU chegou a pedir a suspensão sob alegação de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) teria dificultado garantias para construtoras brasileiras. O ministro Bruno Dantas, no entanto, negou o pedido.
Inicialmente, o leilão estava previsto para 1º de agosto, mas a data foi postergada a partir do roadshow na Europa liderado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e pelo ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, a partir do pleito de possíveis interessados.
O leilão em si não demorou mais do que cinco minutos. Mas o evento demorou quase duas horas, por causa dos 12 discursos realizados após a oficialização do resultado. E, a cada fala de políticos da Baixada Santista, ministros, presidente da Autoridade Portuária de Santos, secretários e demais nomes, o martelo era batido de forma simbólica.
Em fevereiro, durante o lançamento do edital, em Santos (SP), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Tarcísio estiveram juntos no palco, no último encontro público entre os dois. Desde então, os dois têm trocado farpas, por diferenças em temas como política econômica, tarifaço imposto por Donald Trump e julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Até por isso, já era previsto que Lula não compareceria na B3. Quem esteve no evento foi o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviço, Geraldo Alckmin (PSB). O clima era de relativa cordialidade, com discursos celebrando a parceria entre os governos de São Paulo e federal, apesar das divergências políticas.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), destacou o que chamou de “espírito republicano”. “A democracia envolve polarização de ideias e bons argumentos. E aqui estamos dando demonstração da volta da parceria pelo Brasil. Para essa obra sair, foi preciso resgatar o PAC.”
Haddad, no entanto, lembrou que o porto permaneceu sendo público, apesar do desejo do então presidente Jair Bolsonaro em privatizar o terminal santista. Essa ideia foi abortada após o início da atual gestão. Naquela época, Tarcísio era ministro da Infraestrutura.
Tarcísio de Freitas também adotou um discurso pacificador e lembrou que a obra “era uma espera de 101 anos”. “Pegamos o projeto lá atrás, do então governador Geraldo Alckmin, e aperfeiçoamos a ideia. Vamos monitorar minuto a minuto a obra, para fazer como será feito o transporte e imersão das peças. É uma construção muito sofisticada.” Em oito oportunidades, repetiu a expressão “não sabendo que era impossível, foi lá e fez”.
Último a falar, Alckmin lembrou que, durante muitas décadas, surgiram diversos projetos de travessia seca, como uma ponte, que chegou até a ser apresentada maquete, durante a gestão de José Serra (entre 2007 e 2010).
“Fomos ouvir especialistas e a conclusão foi de que a ponte poderia ser um grande limitador para o crescimento futuro do porto de Santos, com navios cada vez maiores. Seria necessário construir uma ponte de 80 metros, o que inviabilizaria o projeto do aeroporto do Guarujá”, lembrou o vice-presidente.
Alckmin também lembrou a tentativa de privatização do porto pelo governo anterior. “Só estamos aqui porque o porto não foi privatizado. E quem está viabilizando a construção é a Autoridade Portuária de Santos.”
Após seu discurso, o ministro dos Portos chamou Tarcísio e Alckmin para que posassem juntos para a foto durante a batida simbólica do martelo.
Até a assinatura do contrato, ainda há algumas etapas a ser cumprida entre a empresa vencedora e os contratantes. A Mota-Engil também precisará comprar capacidade financeira para a execução da obra, além de definir exatamente o traçado do túnel. A expectativa é que a construção tenha início ainda em dezembro.
Fonte ==> NEOFEED