Natais de Vidro e Fé
Na minha casa o Natal começava lá pelo fim de novembro quando minha mãe subia na escada e sacava uma mala feita de palhinha – parecida com essas que hoje são entregues em cestas de fim de ano – mas, como eu era criança e aos 5 anos o senso de proporção é muito diferente, eu achava que era um baú encantado todo amarelinho e de lá saíam muitos enfeites e tesouros que tomavam vida durante o mês de dezembro.
Como uma garotinha espevitada e curiosa, ficava às voltas da minha mãe enquanto ela tirava cuidadosamente cada peça. Primeiro de tudo, no topo, envolto em palha e papel de seda, ficava a ponteira da árvore de Natal – para aqueles que viveram na década de 60 e 70, saberão que os enfeites eram confeccionados em vidro muito fino e pintado. Uma verdadeira obra de arte, porém, frágil, que quebrava ao menor descuido e causava pequenos cortes nas mãos.
Em seguida ela tirava uma a uma as bolinhas, de todos os tamanhos, grandes, médias e pequenas e todas coloridas com vermelho, amarelo, verde, azul e uma infinidade tal qual o arco-íris. Festões verdes, chumaços de algodão que virariam neve, musgo que seria transformado em vegetação e papel celofane de muitas cores que também tinham sua função decorativa.
Entretanto, minha parte predileta era quando saíam do baú mágico muitos carneirinhos, pastores, senhoritas com cântaros à cabeça, animais de todos os tipos, anjos, estrelas, os Reis Magos e a Sagrada Família. Junto a eles muitas folhas de papel imitando pedra que tomariam vida em cima do móvel de canto da sala que se transformava em um dos mais belos presépios que consigo me lembrar.
Luzinhas de pisca-pisca emolduravam a manjedoura, um velho prato com papel celofane azul transformava-se num lago repleto de peixinhos e o anjo sob algodão branquinho tomava lugar acima da gruta do menino-Deus.
Depois vinha a vez da árvore, tudo colorido e vibrante e, por fim, o enfeite da porta de entrada. Não era costume colocar os presentes sob a árvore de Natal na minha casa. Os presentes apareciam misteriosamente sob a cama na noite da véspera do dia 25.
Outro momento inesquecível era a Ceia, para a qual íamos para a casa da minha avó Hilda. Na sala de jantar éramos recebidos com uma mesa farta de doces portugueses. Travessas e travessinhas de arroz doce branco e amarelinho com desenhos em canela em pó; aletria; rabanadas; filhoses; frutas secas e frescas e castanhas assadas e cozidas.
A mesa que ficava na área externa coberta era imensa – para umas 10 ou 12 pessoas – nossa família e alguns amigos mais chegados dos meus avós e um desfile de iguarias salgadas tomava conta na hora do jantar. Bacalhau com batatas e couve, cebolas cozidas com arroz branco e uma tainha que vovô assava no forno que tinha no quintal.
O cheiro da casa é a memória afetiva mais antiga que tenho comigo; a mistura de azeite com leite, canela e açúcar me faz salivar até hoje e traz um aconchego ao meu coração.
Quando dava meia noite havia a troca dos presentes entre os adultos e geralmente meu irmão e eu íamos para casa adormecidos pela espera de ver o Papai-Noel que nunca foi visto, mas que tinha passado em nossa casa e deixado presentes. Era um tempo que não se ganhava muitos mimos, mas, valorizávamos cada um e brincávamos todos juntos na manhã do dia 25 quando retornávamos à casa da vovó para mais uma maratona de comida.
Geralmente uma caça com batatas douradas e muitas conversas. Era um dia de convívio. Um momento de agradecimento e de união.
E você tem memórias afetivas de seus natais passados?
Tenho o hábito de escrever tudo o que me toca e mantenho um diário para lembrar de acontecimentos que possam ser transformados em poemas, livros ou mesmo uma maneira sutil de autoterapia. Hoje faço um convite para que você comece nesse ano de 2025 a criar um caderno de memórias natalinas. Comece contando como foi o seu Natal em família ou sozinho, relembre seus momentos de criança e adolescente. Depois siga descrevendo seus sonhos para o ano novo que se aproxima. Seus planos para os meses vindouros. Suas viagens importantes. Acontecimentos que transformaram sua visão de mundo e, quando perceber, você está escrevendo todos os dias.
Manter um diário, uma agenda ou até mesmo um bloco de anotações no celular são uma maneira de nos mostrar a nós mesmos e naqueles dias em que parece que a solidão, o cansaço e o desânimo chegam sorrateiros, estarão ali para nos fazer seguir adiante.
Quando começar, conte-me por e-mail ou no meu direct e poderemos transformar o mundo por meio das palavras e dos pequenos gestos que unem todos os seres humanos em um grande abraço.
Feliz Natal e um Ano Novo repleto de saúde e paz.

Helena Fraga
Helena Fraga é escritora, empresária e poeta brasileira, com doze obras publicadas que transitam entre poesia, crônicas e literatura inspiradora. Sua escrita, marcada por sensibilidade, fé e reflexão sobre o cotidiano, aborda temas como amor, espiritualidade e autoconhecimento. Dentre seus títulos estão Aconchego e O Livro de Natal.
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