As apostas de que o Federal Reserve (Fed) irá retomar o ciclo de corte de juros na próxima decisão de política monetária, em setembro, voltaram a ganhar força nesta sexta-feira, 1º, após a divulgação dos dados do mercado de trabalho americano.
A probabilidade precificada por investidores de uma queda de 0,25 ponto percentual (p.p.) na atual taxa básica, de 4,25% a 4,5%, saltou de 38% para 80%. Já a chance de manutenção caiu de 62% para 20%.
O gatilho foi o payroll de julho, que mostrou a criação de 73 mil vagas, bem abaixo da expectativa de 110 mil. Mais do que o dado em si, o que chamou a atenção foi a expressiva revisão dos números anteriores: os dados de maio e junho foram ajustados para baixo em um total combinado de 258 mil postos de trabalho.
De acordo com o U.S. Bureau of Labor Statistics (BLS), os dados de maio foram revisados de 144 mil para 19 mil, uma queda de 125 mil vagas, e os de junho, de 147 mil para 14 mil, uma revisão de 133 mil.
As revisões combinadas — com apenas 19 mil vagas em maio e 14 mil em junho — resultaram em uma média de 35 mil vagas por mês entre maio e julho, o nível mais fraco desde 2010, excluindo os anos da pandemia.
“O Fed vinha colocando a atenção no mercado de trabalho para definir os juros. Falavam que a inflação estava em trajetória benigna, mas que o mercado de trabalho estava firme, com salários fortes e taxa de desemprego baixa, sem espaço para baixar juros. A notícia de hoje dá sinais de arrefecimento”, diz William Castro, estrategista-chefe da Avenue.
Além do corte na próxima reunião, o mercado também passou a precificar a chance de mais uma queda de juros ainda neste ano, em dezembro, com a probabilidade saltando de 8% para 48%. O Fed interrompeu seu ciclo de cortes de juros em novembro do ano passado, após baixar a taxa em 1 p.p. ao longo de quatro reuniões.
Castro relembra que o cenário de dois cortes no segundo semestre era o consenso do mercado até pouco tempo atrás, mas dados recentes, que mostraram a economia americana mais forte do que o esperado, vinham enfraquecendo as apostas em dois cortes em 2025. Um desses dados foi a divulgação do PIB do segundo trimestre na quarta-feira, que revelou uma alta de 3%, 0,5 p.p. acima da expectativa do mercado.
Apesar da aposta na retomada do ciclo de corte de juros em setembro, Roberto Padovani, economista-chefe do BV, avalia que o cenário segue instável e que a percepção de manutenção da taxa ainda pode voltar a ganhar força.
“Se, porventura, tivermos indicadores de inflação ou de atividade um pouco mais fortes na semana que vem, o mercado vai mudar essa visão. Não dá pra dizer que essa informação de hoje muda o patamar de preços permanentemente.”
O economista afirma que ainda há muita dificuldade de leitura sobre o mercado de trabalho americano e o cenário para os juros nos EUA, em meio às incertezas sobre as tarifas sobre produtos importados. “É uma dúvida sobre como isso irá impactar a inflação.”
Mas as divergências sobre se é hora de cortar ou não os juros americanos não se restringem apenas aos investidores. Mesmo dentro do próprio Fed, na decisão da quarta-feira, 30 de julho, não houve consenso, com dois votos favoráveis a uma redução de 0,25 p.p. na taxa de juros.
A dissidência foi liderada por Michelle Bowman e Christopher Waller, que nas últimas semanas se colocaram a favor de uma política mais expansionista, acatando as pressões do presidente Donald Trump.
Para Felipe Tavares, economista-chefe da BGC Liquidez, o mercado está inclinado a interpretar dados fracos como gatilho para corte, mas ele reforça que isso não significa que o Fed já esteja convencido.
“Tem uma probabilidade alta de o mercado querer e fazer pressão pra que se leia nesse sentido, de que os juros precisam diminuir. Mas é muito cedo pra falar em probabilidade real de corte. Um dado decepcionante não é suficiente se o mercado de trabalho ainda for visto como saudável.”
Impacto no BC?
Tavares avalia que um eventual corte de juros pelo Fed em setembro pode favorecer a desvalorização do dólar frente a moedas emergentes, como o real, o que teria impacto positivo no controle da inflação no Brasil. “Se você tem uma redução lá dos juros, você aumenta o spread, atrai capital, e isso rebate no câmbio”, diz o economista da BGC Liquidez.
Padovani, contudo, descarta que um corte de juros do Fed em setembro possa antecipar, de alguma forma, o início do afrouxo monetário no Brasil. Um dos pontos, afirma, é justamente o mercado de trabalho local.
Divulgada pelo IBGE, em 31 de julho, a taxa de desemprego no Brasil teve uma queda em junho, recuando de 6,2% para 5,8%, a menor já registrada. O número veio mais forte que o esperado por economistas, que projetavam queda para 6%.
“A taxa de desemprego está super baixa e continua caindo. O dado de ontem mostrou um mercado de trabalho muito forte, ao contrário do que estamos vendo nos Estados Unidos no momento.”
Fonte ==> NEOFEED