Guerras comerciais, embargos, sanções, corrida por recursos naturais, disputa por semicondutores e até conflitos armados. A geopolítica se tornou a força determinante das relações entre países e tem remodelado a economia global, obrigando os investidores a reverem seus mapas de risco e retorno.
A guerra tarifária imposta pelos Estados Unidos sob o comando de Donald Trump não é apenas uma medida protecionista, mas sim a ponta do iceberg de mudanças profundas em curso na economia global em que o foco não é mais produzir com menor custo, mas sim de forma estratégica.
“Isso cresceu agora, mas é algo crescente desde a pandemia, quando vários países se sentiram frágeis por não ter o domínio da capacidade produtiva da forma como imaginavam e começaram a rever seus modelos produtivos”, afirma Solange Srour, diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management, em entrevista ao Wealth Point, programa do NeoFeed.
Isso está reorganizando as cadeias produtivas pelo mundo. Artur Wichmann, CIO da XP, explica que se a globalização dos últimos anos levou os países a buscarem uma produção mais eficiente, agora a busca será por onde ela fica mais segura.
“Nos últimos 50 anos, criamos cadeias de produção extremamente eficientes para minimizar custo. Então, a gente vai colocar a fábrica do tênis Nike no lugar que é mais barato, na China. Só que essa cadeia global não aguenta choque e a pandemia mostrou isso”.
O resultado dessa nova ordem é um mundo menos eficiente, que cresce menos, tem mais dívida e é mais inflacionário e juros mais altos. E nesse novo cenário, a Europa enfrenta dificuldades adicionais.
O Velho Continente, além dos desafios tradicionais de crescimento e inovação, precisa lidar agora com mudanças geopolíticas significativas e com a perda do apoio norte-americano irrestrito para garantir a sua segurança. E a expectativa é que perda cada vez mais relevância no tabuleiro global.
“O capitalismo europeu não deu soluções de inovação, não criou aquilo que o Schumpeter chamava de destruição criadora, porque tem um ambiente de negócios muito hostil à inovação”, afirma Wichmann.
Se a Europa perde poder, a China vem ganhando e ensaiando uma nova guerra fria com os EUA, que tem como plano de fundo a disputa por semicondutores. Até então, a produção estava em Taiwan, mas isso é algo que os EUA não estão mais confortáveis.
“Quando a gente escrever os livros de história do século XXI, o tema será a quarta revolução industrial, sobre essa mudança de padrão tecnológico. A guerra comercial do Trump vai ser nota de pé de página como sintoma disso”, diz Wichmann.
Essa disputa está aos poucos dividindo o mundo. Se até aqui o Brasil conseguiu se passar por neutro, ao que tudo indica, não poderá mais por muito tempo. Para Solange, será inevitável uma tomada de posição mais clara no futuro.
“Essa guerra fria é uma busca por segurança e há uma disputa acirrada sobre a América Latina. O quanto a China vai se fortalecer vai depender exatamente desses espaços que ela vai ocupando, assim como ocupa na África, e agora por aqui. E a gente, aqui no Brasil, está exatamente no meio dessa batalha. Teremos que mostrar o lado que estamos.”
Para os dois especialistas, os investidores precisam mais do que nunca diversificar suas carteiras e buscarem ativos resilientes para aguentarem as incertezas de um mundo mais conflituoso e menos guiado pela eficiência econômica, estando atentos ao custo de produção e a mudança de padrão tecnológico. E com taxas de juros estruturalmente mais altas, impondo um novo valuation para os ativos.
Fonte ==> NEOFEED