Após mais de um ano de debates em torno da proposta de emenda constitucional (PEC) do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a segurança pública, ainda resta grande dúvida a real eficácia da medida. O Legislativo, ocupado com teses sensacionalistas nessa seara, não parece ter pressa em debater a fundo o texto.
Na quinta (9), sua votação foi adiada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados após pedido de vista coletivo. A proposta, que já tinha sido discutida em 2024 com representantes de gestões estaduais e da Justiça, agora recebeu mudanças que a transformam numa norma mais simbólica, com poucas boas ideias.
Uma das alterações atende demanda de governadores para conter maior protagonismo do governo federal. Foi retirado do texto o dispositivo que autorizava exclusivamente a União a legislar sobre normas gerais de segurança pública, defesa social e sistema penitenciário, mantendo assim o sistema de ação conjunta com estados e municípios.
Diante de resistências, seria sensato não tentar reinventar a roda. Gasta-se capital político escasso para poucas mudanças positivas por meio da PEC, cedendo espaço para a oposição que advoga uma visão linha dura no setor.
Mais vale esclarecer qual é de fato o modelo de política de segurança pública defendido pelo governo petista e qual resposta o Congresso Nacional tem a oferecer que não seja o populismo penal.
Algumas medidas mais radicais por enquanto não prosperaram. Governadores tentam reciclar a ideia temerária de que estados deveriam ter o poder de legislar em matéria penal, hoje privativo à União. Medida que, no limite, levaria à situação caótica de um país com 27 códigos penais.
O governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD) já defendeu que “cada estado tenha a sua legislação penal”; Ronaldo Caiado (União Brasil), no comando da gestão de Goiás, também apoiou a ideia numa reunião com Lula em 2024.
É deplorável que um Congresso conservador concentre sua produção na segurança pública em propostas reacionárias ou populistas —como a ampliação do uso legítimo de armas de fogo ou a castração química de condenados em casos de violência sexual, que avançaram recentemente em comissões parlamentares.
A PEC, por si só, não mudará de fato a segurança pública no país. São necessárias políticas coordenadas, baseadas em dados técnicos. Mas tudo indica que o Congresso e o governo federal estão mais ocupados em vender remédios simples e ineficazes para problemas complexos.
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Fonte ==> Folha SP