O mercado financeiro brasileiro viveu uma verdadeira explosão de novos investidores na última década. De acordo com a B3, o número de pessoas físicas com contas ativas saltou de cerca de 600 mil em 2016 para mais de 5 milhões em 2023. Dentro desse movimento, o trading, especialmente o day trade, conquistou milhares de adeptos que sonham com lucros rápidos. Mas a realidade é que a maioria não chega a completar dois anos de atividade.
Um estudo da Fundação Getúlio Vargas analisou quase 100 mil pessoas que iniciaram operações de day trade entre 2013 e 2016. O resultado foi contundente: mais de 99% desistiram ou abandonaram as operações antes de completar 300 pregões. Entre os poucos que persistiram, a média de ganhos diários foi negativa, reforçando que a consistência nesse mercado é exceção. A pesquisa ainda mostrou que apenas um em cada mil operadores conseguiu resultados que compensassem os riscos assumidos.
Esse fenômeno não é exclusivo do Brasil. Relatórios internacionais indicam que entre 70% e 90% dos traders de varejo em mercados de câmbio e contratos futuros encerram suas operações com prejuízo. Nos Estados Unidos, estudos acadêmicos também apontam que a taxa de insucesso no curto prazo supera 80%, mesmo em períodos de alta liquidez. A conclusão é semelhante em diferentes países: o fator decisivo não é a falta de oportunidades, mas a ausência de preparo técnico e psicológico.
Consultado pela reportagem, o trader Estefano dos Santos, com uma década de experiência no setor e criador da metodologia conhecida como Relógio de Confirmação, explica que a expectativa irreal é a principal armadilha. “A maioria dos que desistem não perde por falta de oportunidade, mas por falta de disciplina. O mercado é exigente e não perdoa improvisos. Sem estudo, técnica e equilíbrio emocional, as perdas são inevitáveis”, afirma.
O impacto financeiro da indisciplina é expressivo. Segundo levantamentos do mercado, as perdas acumuladas por traders iniciantes chegam a bilhões de reais por ano, considerando custos operacionais, alavancagem e liquidação de posições forçadas. Essa dinâmica se repete em ciclos, com novos entrantes assumindo riscos semelhantes e abandonando a atividade em poucos meses.
Para Estefano, a raiz do problema está na forma como muitos enxergam o trading. “É possível viver de trading, mas não sem disciplina. É como qualquer profissão: exige anos de dedicação, aprendizado e, principalmente, resiliência. Quem busca atalhos acaba se frustrando e reforça a estatística de desistência”, conclui.
A experiência mostra que, em um mercado cada vez mais competitivo, não é o operador mais ousado que sobrevive, mas aquele que mantém constância, gestão de risco e controle emocional. E se a maioria desiste, é justamente porque ainda não aprendeu a dominar o maior adversário do trader: suas próprias emoções.