Em 27 de novembro, foi publicada a Lei 15.270, fruto do PL 1.087 proposto pelo Poder Executivo como parte de uma pretensa reforma tributária da renda. Com efeitos a partir de 1º.01.2026, a nova lei promove alterações significativas no IR da Pessoa Física, ampliando a faixa de isenção para rendimentos de até R$ 5.000/mês e reintroduzindo a tributação dos dividendos, esta segunda medida como parte de um novo regime de IR Mínimo para contribuintes de alta renda.
A ampliação da faixa de isenção é positiva e possui desdobramentos políticos e socioeconômicos indiscutíveis. No entanto, o alívio fiscal impôs a necessidade de buscar novas fontes de arrecadação, e nesse contexto se insere a reintrodução da tributação sobre dividendos, quase 30 anos após a criação de sua isenção.
A medida foi implementada sem análise estrutural ou redesenho sistêmico do IR. A tributação dos dividendos ressurge como compensação da renúncia gerada, para viabilizar a aprovação da lei em momento estratégico para o Governo Federal. Infelizmente, não foi alterada a carga tributária da renda corporativa, ponto fundamental para uma efetiva reforma tributária da renda.
Nos termos da Lei 15.270, lucros e dividendos pagos a pessoas físicas residentes, a partir de 1º.01.2026, pela mesma pessoa jurídica em montante superior a R$ 50 mil/mês, sofrerão retenção de 10% de IR sobre o valor total. Para pessoas físicas ou jurídicas não residentes no país, a retenção ocorrerá independentemente do valor.
A nova lei prevê um regime de transição para os lucros apurados até 31.12.2025, que permanecem isentos, desde que sua distribuição seja deliberada em 2025, sejam exigíveis, nos termos da legislação civil ou empresarial aplicável, e seu pagamento, crédito, emprego ou entrega ocorra nos termos originalmente previstos no ato de aprovação. Ainda, para fins do novo IRPF Mínimo, poderão ser deduzidos dos rendimentos anuais os lucros e dividendos apurados até 31.12.2025, que observem os requisitos acima e cujo pagamento, crédito, emprego ou entrega ocorra em 2026, 2027 e 2028.
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Diversos aspectos dessa regra transitória têm sido criticados, especialmente quanto à viabilidade de seu cumprimento prático e à clareza de sua redação. Em primeiro lugar, trata-se de um desafio operacional significativo: é pouco provável que o resultado de 2025 seja apurado e aprovado em 2025. Além disso, a norma parece colidir com a Lei das S.A., que determina o pagamento de dividendos no mesmo exercício em que aprovados. Já a nova lei exige que os dividendos deliberados em 2025 sejam pagos em 2026, 2027 e 2028, criando um descompasso entre os regimes tributário e societário.
Não menos importante é a situação dos sócios e investidores não residentes, que permanece envolta em dúvidas. A Lei 15.270 não explicita se os mesmos requisitos para isenção dos lucros apurados até 2025 se aplicam a sócios residentes no exterior. Há quem defenda tratar-se de mero erro redacional, a ser corrigido até 2026. No entanto, não há qualquer compromisso do Congresso ou do Governo Federal para tal ajuste e, considerando o apertado prazo para a realização de assembleias e declaração de dividendos, uma correção tardia provavelmente será ineficaz.
Diante dessas incertezas, diversas medidas têm sido discutidas para mitigar os riscos de tributação dos lucros apurados até 2025. Em alguns casos, têm prevalecido condutas mais conservadoras como deliberação e pagamento em 2025, com base em balancetes intermediários. Para aquelas que não dispõem de caixa suficiente, uma alternativa a ser avaliada é a capitalização de lucros. Estratégias voltadas à forma e aos termos da deliberação também podem ser eventualmente adotadas para robustecer a tese de inaplicabilidade da nova lei a tais valores. Fato é que as empresas devem avaliar suas estruturas, lucros acumulados e correntes e fluxos de caixa, para definir a estratégia mais adequada à sua realidade.
Algumas das críticas mais contundentes à nova lei já começam a repercutir no próprio Legislativo. Parte essencial dessas preocupações foi incorporada à Emenda nº 75 ao PL 5.473, propondo que, diante da impossibilidade material e jurídica da previsão trazida pela Lei 15.270, a deliberação sobre a distribuição dos lucros possa ocorrer até 30.04.2026.
A Lei 15.270 nasce com altíssimas chances de litígio, tanto é que o Sescon-SP impetrou Mandado de Segurança perante a Justiça Federal do DF, visando a resguardar seus associados de serem obrigados a aprovar, até 31.12.2025, a distribuição dos lucros apurados no próprio exercício.
As discussões judiciais tendem a focar, inicialmente, em aspectos como a impossibilidade prática do cumprimento do regime de transição para lucros apurados até 2025. Isso pode levar a questionamentos sobre a violação de princípios como segurança jurídica, irretroatividade e razoabilidade. Nesse cenário de incertezas, a atuação do Poder Judiciário, mais uma vez, poderá ser crucial para pacificar a interpretação e a aplicação da Lei 15.270.
Fonte ==> Folha SP

