A credibilidade das contas públicas continua a ser minada com a flexibilização pelos três Poderes dos limites de gastos. A qualquer demanda, meritória ou não, criam-se novas despesas, em vez de se fazer escolhas a partir de restrições.
Exemplo recente é o caso dos descontos fraudulentos de aposentados e pensionistas do INSS por sindicatos e associações. Para acelerar a resolução do problema e conter a judicialização, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, homologou os termos propostos pelo governo para a devolução do dinheiro.
Os beneficiários que contestaram os descontos e não obtiveram resposta das entidades associativas receberão os valores corrigidos pelo IPCA. Até o momento, são cerca de 3,6 milhões de contestações, e a maioria deve gerar ressarcimento. A adesão ao acordo é voluntária, mas quem já entrou na Justiça contra o INSS precisa desistir da ação.
Contudo a medida, correta para as partes, carrega uma distorção, já que o magistrado autorizou que os valores estimados em R$ 3 bilhões sejam pagos por meio de crédito extraordinário, que está fora dos limites legais de gastos e da meta fiscal, que prevê deficit primário zero neste ano.
Excluir o pagamento às vítimas do INSS do ordenamento orçamentário significa lesar duas vezes os contribuintes. A decisão mais sensata seria cortar outras despesas menos prioritárias.
Não se trata, ademais, de evento isolado na administração pública, pois os gastos extraordinários vem se multiplicando nos últimos anos, como os precatórios que estão fora das contas até o final de 2026. Agora, considera-se expandir prazos de pagamento de demandas judiciais para estados e municípios. Não é difícil antever os resultados nefastos.
Dispêndios tratados arbitrariamente como “extras” mascaram a verdadeira situação das finanças do Estado. Cada real fora do planejamento pressiona o endividamento público, aumenta os juros da dívida e reduz o espaço para investimentos produtivos.
É imprescindível que todas as despesas sejam incorporadas às metas. Isso não significa negar direitos, mas garantir que eles sejam cumpridos de modo sustentável. As boas práticas orçamentárias existem para proteger o país de aventuras que, no passado, causaram inflação e recessão.
Ao ignorá-las, estimula-se a instabilidade. É necessário diálogo interinstitucional para alinhar as decisões do STF, do Executivo e do Legislativo às restrições do Orçamento. Mas não parece haver em nenhum dos Poderes lideranças com tal disposição.
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Fonte ==> Folha SP