Pouco mais de três anos após a invasão da Ucrânia, quando o presidente russo Vladimir Putin deu uma guinada nas políticas fiscal e monetária do país, substituindo-as por uma “política econômica de guerra”, centralizada em gastos militares e exportações constantes de petróleo para impulsionar o Produto Interno Bruto (PIB), a Rússia finalmente começa a sentir os efeitos da guerra refletidos nos indicadores econômicos.
Após uma breve recessão em 2022, os gastos militares — os maiores desde a era soviética, ultrapassando 6% do PIB neste ano — impulsionaram a economia russa e atenuaram o impacto das sanções ocidentais. Isso se compara a cerca de 3% do PIB nos EUA e cerca de 2% na Alemanha no ano passado.
Os gastos com forças armadas e segurança representam cerca de 40% do gasto total do governo russo neste ano. A capacidade da Rússia de redirecionar as exportações de petróleo para a China, aliada ao apoio chinês no fornecimento de eletrônicos e máquinas, proporcionou um impulso econômico adicional.
Mas os ventos estão começando a mudar. Os primeiros sinais surgiram no primeiro trimestre. O PIB russo, que cresceu 4,1% em 2023 e 4,3% em 2024 – mais do que a maioria dos países ricos do Ocidente, apesar das sanções – avançou modestos 1,4% no primeiro trimestre em relação ao ano anterior, bem abaixo dos 4,5% registrados no quarto trimestre de 2024.
A inflação, que havia disparado após o início da guerra e a imposição de sanções, atingindo quase 12% em 2022, jamais foi controlada nesses anos e fechou maio em 9,9%.
Mas foi em junho que o alerta soou de vez. A indústria teve a maior queda em mais de três anos, as vendas de carros novos caíram quase 30% em comparação ao mesmo mês de 2024 e, para completar, empresas de setores civis, como móveis e tratores, passaram a reduzir a produção. Há dificuldades também na construção civil e no setor siderúrgico.
“O modelo de crescimento baseado apenas em gastos militares está falido”, disse Janis Kluge, especialista em economia russa do Instituto Alemão de Assuntos Internacionais e de Segurança. “As capacidades da parte civil precisam ser reduzidas, liberando trabalhadores para que a máquina de guerra possa continuar a crescer. Isso não é sustentável.”
Recessão à vista
O quadro sombrio levou autoridades russas a admitir implicitamente que a ilusão do crescimento da economia bombado pela guerra está cobrando o preço. O ministro da Economia, Maxim Reshetnikov, alertou que a Rússia está à beira de uma recessão – o que se reflete na taxa de juro, em 21%, que trava o investimento privado.
O banco central russo anunciou na semana passada que debateria a redução da taxa básica de juros ainda este mês, após reduzi-la em junho. Mesmo assim, o governo russo, que opera com déficit desde o início da guerra, projeta mantê-lo por pelo menos mais dois anos.
Dois fatores ajudaram a acelerar o declínio econômico. O primeiro deles surgiu em novembro, quando os EUA endureceram as sanções contra o Gazprombank, um dos principais bancos privados russos. Usado como canal de pagamento para o petróleo e gás russos e no financiamento de projetos militares, o Gazprombank foi excluído do sistema financeiro americano.
Após o anúncio das sanções americanas, o rublo perdeu um quarto de seu valor frente ao dólar em pouco tempo. A bolsa de valores russa sofreu quedas acentuadas, com vendas em massa, especialmente nos setores financeiro e energético.
Mas foi a queda no preço do petróleo que influenciou mais na derrocada econômica russa. Na semana passada, o Ministério das Finanças anunciou que a receita de petróleo e gás da Rússia em junho caiu para o menor nível desde janeiro de 2023.
Os preços do petróleo — que têm se mantido, em geral, mais baixos este ano, apesar da turbulência no Oriente Médio — representam um grande risco para a Rússia, que depende da venda de energia para cerca de um terço de sua receita orçamentária.
Essa demora para que os efeitos da guerra se refletissem nos indicadores do País sempre intrigou os economistas ocidentais.
Desde a decretação das sanções mais severas por União Europeia, EUA, Reino Unido, Japão, em fevereiro de 2022, com a invasão em larga escala da Ucrânia, a Rússia teve ativos congelados no exterior e foi excluído de sistemas financeiros como o SWIFT.
Em 2022, o PIB caiu US$ 200 bilhões abaixo do potencial estimado. O custo total acumulado até 2025 é difícil de mensurar com precisão, mas pode ultrapassar US$ 1 trilhão em perdas diretas e indiretas, segundo projeções de analistas internacionais. Mesmo assim, Putin seguiu resistindo, graças às vendas de petróleo para Índia e Turquia, além da China.
Os problemas econômicos aumentam a pressão sobre o Kremlin, reduzindo a capacidade financeira de que dispõe para financiar sua luta na Ucrânia.
Se as sanções se intensificarem ainda mais ou os preços do petróleo continuarem em queda, Putin provavelmente terá de aceitar os pedidos de cessar-fogo do presidente americano Donald Trump e sentar para negociar a paz na Ucrânia.
Se isso ocorrer, será graças à economia russa, e não ao presidente americano.
Fonte ==> NEOFEED