o que Congresso e governo devem negociar com Moraes

Fernando Haddad

Com tentativa de conciliação marcada para 5 de julho, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o Congresso Nacional devem manter suas posições sobre o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). De um lado, o Executivo ainda acredita que a elevação de impostos é o caminho para manter a política fiscal do governo; do outro, o Legislativo defenderá que o governo precisa cortar gastos e não deve insistir na política arrecadatória como saída para o impasse econômico.

Na sexta-feira (4), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu os decretos do governo e do Congresso sobre o IOF. Com a decisão de Moraes, perdem os efeitos tanto a medida do Executivo que aumentaria as alíquotas do IOF como o Projeto de Decreto Legislativo (PDL), do Legislativo, que derrubou o ato. Além disso, Moraes convocou o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), para uma reunião de conciliação.

Nos bastidores, congressistas esperam Motta retornar a Brasília para negociar as opções que irão apresentar a Moraes. No entanto, o consenso é que admitir o aumento do IOF, ou de outro imposto aventado pelo governo, seria uma derrota política de peso.

Ainda na sexta-feira, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, afirmou que, com a suspensão do decreto do IOF, fica mantida a necessidade de  contingenciamento de recursos orçamentários. “Por fim, temos certeza de que a justiça tributária é o melhor caminho para o país e para as contas públicas, de forma que não sejam impactados os direitos do povo e dos trabalhadores”, disse a ministra.

Do lado da oposição, o senador Ciro Nogueira (PP-PI) criticou a tese defendida pelo governo e argumentou que os Três Poderes precisam cortar gastos. “A população está sufocada. A cada mês surge um novo aumento de imposto. É hora de cortar na própria carne: Executivo, Legislativo e Judiciário precisam dar exemplo”, afirmou.

A Comissão Mista que irá avaliar a medida provisória (MP) que estabelece uma alternativa ao IOF é vista como um caminho que pode ser o meio termo para as divergências entre governo e Congresso. A proposta enviada pelo Planalto em junho acaba com a isenção de Imposto de Renda (IR) de títulos incentivados, como LCA e LCI, que, a partir do ano que vem, serão tributados em 5%. Representantes da bancada do agro já se posicionaram contra a taxação das Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e prometem barrar a medida.

Além disso, a MP adota uma alíquota uniforme de 17,5% para os demais investimentos no mercado financeiro, incluindo criptomoedas. Atualmente, a tributação é regressiva, de 22,5% a 15%, de acordo com o tempo em que o recurso ficar aplicado. 

Também estão previstos na MP um aumento do IR sobre a distribuição de Juros sobre Capital Próprio (JCP), de 15% para 20%, assim como a elevação de 9% para 15% da Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) das fintechs. Há ainda o aumento da taxação das bets, de 12% para 18%.

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Motta sinalizou que quer mexer nas isenções fiscais

As isenções fiscais também estão no cardápio de possibilidades que o Congresso pode ofertar ao governo para impedir o aumento do IOF. Como o Legislativo se mostrou resistente a aumentar as alíquotas das letras de crédito, Motta afirmou que está disposto a discutir a revisão das isenções que, segundo ele, têm crescido “de maneira muito forte” e devem somar R$ 600 bilhões neste ano, o que ele considera insustentável.

Ele defendeu a construção de medidas estruturantes, “sem penalizar” quem produz e as pessoas mais carentes. “O que não pode é termos gambiarras para solucionar algo que já pede há muito tempo um debate mais profundo”, frisou.

“Dizer que esse imposto afeta só as classes mais altas, não é verdade, é uma narrativa que não é verdadeira. Nós temos que ser claros que esse imposto traria um aumento em toda a cadeia, onde todos do mais carente ao mais abastado, do mais pobre ao mais rico, iriam pagar mais pelas operações financeiras que estavam tendo um reajuste na sua alíquota”, ressaltou.

Conciliação virou rotina para resolver problemas políticos 

Além da questão do IOF, o Supremo vem utilizando a conciliação como ferramenta para forçar Congresso e Palácio do Planalto a chegarem a um entendimento. Em 2023, o ministro Gilmar Mendes estabeleceu uma Câmara de Conciliação para tratar de ações que questionam a constitucionalidade da Lei 14.701, que instituiu a tese do marco temporal em terras indígenas.

Na época, o ministro, que é relator das ações, reuniu representantes das populações indígenas e do governo, como a Advocacia-Geral da União (AGU), da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), do Ministério dos Povos Indígenas (MPI); e representantes de partidos políticos, como o Progressistas, Republicanos e o Partido Liberal.

Em junho do ano passado, a pedido do governo, o ministro Cristiano Zanin suspendeu a vigência da lei que prorrogava até 2027 a desoneração da folha de pagamento. A medida não foi bem vista pelo Congresso, mas, para obter um meio termo com o ministro, os parlamentares aceitaram realizar um acordo com o governo. A posição do Congresso fez Zanin retomar a eficácia da lei e dar uma prazo para que Legislativo e Executivo encontrassem uma solução consensual sobre a desoneração da folha.

O impasse envolvendo as emendas parlamentares também foi motivo para que Legislativo e Judiciário sentassem à mesa de negociação. Ao bloquear parte das emendas parlamentares, em dezembro de 2024, o ministro Flávio Dino determinou que o governo e Congresso apresentassem planos para melhorar a rastreabilidade das emendas após serem identificadas irregularidades nos repasses para Organizações Não Governamentais (ONGs). Em fevereiro, o ministro voltou a liberar os repasses após reunião com os demais poderes.

Oposição e Centrão planejam impor novas derrotas ao governo para retaliar judicialização do IOF

Apesar da reunião de conciliação, a expectativa é de que o governo seja retaliado no Congresso pela judicialização do IOF. Parlamentares ouvidos pela reportagem admitem, por exemplo, que a Câmara tem em suas mãos um leque de possibilidades para impor novas derrotas ao Planalto. Uma das propostas prioritárias e que ainda depende do aval dos deputados, por exemplo, é a que prevê a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil por mês. A aprovação desse projeto é vista como primordial para Lula tentar recuperar sua popularidade para a disputa de 2026.

O texto é relatado pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), ex-presidente da Câmara e responsável pela candidatura que elegeu Hugo Motta para sua sucessão. Na semana passada, Lira chegou a adiar a apresentação do seu parecer diante do desgaste da base governista.

Outro ponto de reação diz respeito à composição da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI) das fraudes no INSS, quando foram descobertos descontos irregulares nos benefícios de aposentados e pensionistas. O colegiado será instalado em agosto e existe uma pressão entre alguns líderes para que Motta, por exemplo, indique um nome da oposição para ser o relator, entre os cotados está o de Nikolas Ferreira (PL-MG).



Fonte ==> Gazeta do Povo.com.br

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