MERCADO DE AÇÕES

Marcio Aguiar, diretor da divisão Enterprise da Nvidia para América Latina, e Fernando Haddad: ministro foi aos EUA para atrair investimentos de big techs e acena com benefícios fiscais para data centers.

Governo Lula insiste em erros do passado para atrair data centers

A política de atração de data centers do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mira o futuro, mas se baseia em velhas práticas que não se reverteram em ganhos para a economia e a sociedade. Especialistas apontam que o plano repete vícios da política industrial e econômica: amplia renúncias fiscais sem garantia de resultado, dribla as regras do arcabouço fiscal, cria distorções competitivas e se apoia em promessas frágeis de sustentabilidade e inovação. Ou seja, pode acabar reproduzindo o ciclo de incentivos ineficazes que marcou experiências anteriores como a Zona Franca de Manaus e os programas de estímulo à indústria automobilística. O que são data centers e o que o governo oferece Data centers são grandes instalações que hospedam equipamentos para armazenar e processar dados digitais, mantendo sites, aplicativos e serviços on-line em funcionamento. São imprescindíveis para dar conta do crescimento exponencial de modelos de inteligência artificial, pois oferecem alta capacidade de processamento, armazenamento massivo e conectividade ultrarrápida – elementos essenciais para treinar, executar e escalar soluções de IA. Publicada em meados de setembro deste ano, a Medida Provisória (MP) 1.318 estabeleceu algumas das diretrizes do plano e criou o Regime Especial de Tributação para Serviços de Datacenter, ou ReData. A fórmula é conhecida de outros tempos: isenção tributária e, em contrapartida, doação de percentual da receita para programas do governo visando ao desenvolvimento industrial e tecnológico. As empresas participantes do ReData ficam isentas de: Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins incidentes sobre a receita; Contribuição para o PIS/Pasep-Importação e Cofins-Importação; IPI, incidente na importação ou na saída do estabelecimento industrial ou equiparado; e Imposto de Importação. Em compensação, as empresas precisam atender a critérios de sustentabilidade, ter sua demanda elétrica totalmente suprida por fontes limpas ou renováveis e destinar 10% de sua capacidade de armazenamento para o uso do governo e 2% do valor dos equipamentos adquiridos para programas de incentivo ao desenvolvimento tecnológico. Haddad critica incentivos fiscais, mas aposta neles para atrair data centers Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, afirma que o ReData não deixa de ser mais um gasto tributário — nome dado às isenções e aos regimes tributários diferenciados a setores específicos —, de que o governo diz não gostar, mas que ele próprio não para de criar. Em inúmeros discursos e entrevistas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, alardeou sua intenção de reduzir as renúncias de impostos. Em maio passado, por exemplo, declarou que o país tem uma “caixa-preta” de benefícios fiscais que tira R$ 800 bilhões ao ano dos cofres do governo. “Ao invés de oferecer uma alíquota média de tributos menor para todo mundo, a gente resolve escolher os campeões nacionais que levam o grosso do Orçamento. Aquele que paga imposto fica prejudicado por aquele que fez do lobby a sua profissão de fé”, disse o titular da Fazenda na ocasião. Levantamentos da Receita Federal indicam que, apenas na esfera federal, os incentivos fiscais passam de 4% do PIB. Estudos apontam que tais benefícios costumam ter deficiências de governança, transparência e eficiência. Carecem de critério claro para avaliação de impacto, concentram-se em poucos setores e favorecem empresas específicas, o que gera distorções na competitividade. Hamilton Carvalho, auditor tributário do estado de São Paulo e autor do livro Desafios Inéditos do Séc. XXI, avalia que o projeto tem poucas chances de entregar resultados efetivos. “Chama a atenção a mania [do governo] de criar planos grandiosos, cheios de lindas intenções no papel, mas com regras complicadas, com pouca capacidade de adaptação e que geralmente passam longe de entregar a contribuição prometida”, disse. Sobre a questão fiscal, Carvalho avalia que, da forma como está proposto, o ReData pode criar uma dinâmica de perpetuação das exceções tributárias, como se vê em programas para a proteção da indústria automobilística e regimes especiais como a Zona Franca de Manaus. Governo espera atrair investimentos de R$ 2 trilhões com o ReData As avaliações dos especialistas vão de encontro ao discurso do governo sobre o tema. Em maio, o ministro Haddad apresentou o que chamou de plano de desenvolvimento de inteligência artificial e de data centers para grandes empresas de tecnologia dos EUA, durante viagem de apresentação da estratégia. Na ocasião, ele afirmou que o programa colocava o Brasil “na fronteira da reglobalização sustentável e em uma reindustrialização nacional promissora”. Segundo o governo divulgou naquele momento, o plano teria a capacidade de atrair até R$ 2 trilhões em investimentos para o país em dez anos. VEJA TAMBÉM: Governo vai aos EUA e acena com redução de impostos para atrair big techs ao Brasil Na mesma viagem, após visita às instalações da Nvidia, nos Estados Unidos, o ministro disse, em publicação no seu perfil no X, que a política de atração de investimentos em inteligência artificial e data centers contava com “inúmeras vantagens competitivas”, citando a energia verde e a desoneração de insumos decorrentes da reforma tributária. Especialistas questionam vantagens competitivas do país As vantagens mencionadas por Haddad, no entanto, são contestadas pelos especialistas. Marcos Mendes questiona a real vantagem competitiva do Brasil em relação à energia limpa. Em artigo publicado na Folha de S.Paulo, o economista observa que a rede nacional está precarizada e que, além disso, a energia é cara. Mendes também cita a escassez de mão de obra qualificada, a legislação ambiental pouco ágil e a infraestrutura logística deficitária como pontos que podem colocar em xeque as ditas vantagens nas quais o governo se apoia para defender o plano de data centers. O governo, de sua parte, menciona a boa estrutura de cabos submarinos, que serviria para transmitir dados a outros continentes. No entanto, como a própria MP 1.318 aponta, a operação desses serviços no país é 30% mais cara do que em outros locais – e aí entra a justificativa para a necessidade de um regime fiscal diferenciado. VEJA TAMBÉM: Disputa de governo e big techs se acirra com apuração dos EUA e ameaça negócios no Brasil Falta robustez na rede elétrica e na infraestrutura logística Sócios no Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano

efeitos da decisão do STF

efeitos da decisão do STF

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de determinar que o Congresso regulamente o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) tende