“Foram quase cinco anos de uma história que agora chega a um final feliz, não como nos contos, mas como foi tudo na nossa vida: real, intenso e cheio de amor. As relações se transformam e, portanto, não houve um único motivo, nem um rompimento brusco, o que existiu foi conversa, respeito e maturidade.”
Foi assim que Paolla Oliveira e Diogo Nogueira anunciaram o fim da relação sem explicá-lo de forma objetiva ou pontual. “Não houve um motivo único”, dizem os dois —e de fato raramente há. Ainda assim, quando qualquer um de nós diz que se separou, a primeira pergunta que vem é: por quê?
Como se todo fim precisasse de uma explicação clara e de um motivo forte o suficiente para ser legitimado. Muitas vezes somos nós mesmos, já dentro de uma relação que sentimos desencontrada, que buscamos esse motivo forte e claro —forte para não nos sentirmos tão frágeis diante dos alicerces que desabam; claro para tentar aliviar o embaralhamento de um dos períodos mais turvos da vida, quando tememos estar sendo míopes ou, ao contrário, hiperfocados em detalhes que talvez pudessem ser relevados.
Talvez esse fim público, de um casal companheiro, amoroso, solar, seja um convite para olharmos nossos amores privados e nos darmos o direito de desnaturalizar a ideia de que o nobre, o correto, o maduro seria sempre persistir e insistir na reconstrução de um vínculo que já não se sustenta no presente.
O amor não é claro no começo e tampouco é claro no fim. Assim como não existe um porquê totalmente nítido do apaixonamento, muitas vezes também não existe uma clareza absoluta do porquê não se quer mais seguir. A decisão costuma vir de uma soma de desencontros e descuidos que vão esgarçando o vínculo. Pra que levá-lo ao limite?
Quantas vezes postergamos fins já anunciados e nos machucamos jurando para nós mesmos que seguíamos tentando fazer aquele amor funcionar? Mas por que amor exatamente estávamos lutando? Um amor-apego, amor-medo, amor-hábito, amor-teimosia? E, nessa batalha, quantas vezes lutamos um contra o outro ao invés de lutarmos juntos por algo? Faz sentido então tornar-se cada vez mais oponente daquele que deveria ser seu aliado nesse caminho de reencontro e reconstrução de um “nós” que mais do que fazer sentido faça vocês dois se sentirem conectados hoje, como casal?
Por vezes, dizemos que estamos investindo na reconstrução da relação quando, na verdade, estamos investindo na manutenção do nosso ideal, do nosso apego ao que fomos juntos e da fantasia de um futuro possível que já não conversa com esse novo eu e com esse novo outro. Amores deslocados da pessoa e da vida do presente: amor pela história, por como eu me senti, por quem eu fui ali.
Vejo casais que permanecem resignados em casamentos esvaziados, sustentados pela ideia de que “a vida adulta é assim”. Outros ficam fixados na intensidade do que foi, como se ela pudesse ser resgatada. Às vezes há até tesão, mas a fome de vida é diferente. Um descompasso de desejos, mudanças que se tornaram afastamentos
Georges Bataille diz que “o amor é a experiência do impossível, quando dois seres se reconhecem como descontínuos e, ainda assim, ousam dizer sim”. Dizer sim não precisa ser “sim, ficarei com você pra sempre”. Talvez o gesto mais amoroso, em certos momentos, seja reconhecer essa descontinuidade e aceitar que dizer sim à vida pode significar não insistir na permanência do casal.
Saber ir embora é cuidar daquele amor de outra forma. É não levar o outro ao limite, nem a nós mesmos. Porque, muitas vezes, esperando o amor acabar, corremos o risco de que o respeito, o cuidado e o carinho acabem antes. Por que validar um relacionamento que acaba com um “eu não quero mais” antes de chegar ao “eu não aguento mais” é parar de romantizar o levar-se ao limite.
Poder dizer “eu te amo, mas não está funcionando, não estamos nos fazendo bem, queremos coisas muito diferentes, e por amor é melhor que cada um siga seu caminho” é infinitamente mais bonito do que arrastar o outro para o nosso ideal ou nos anularmos em nome da manutenção de um amor que sufoca.
Fico pensando nas conversas difíceis que temos com pessoas queridas doentes em estados terminais, quando dizemos: “eu te amo e te deixo ir. Não precisa ficar aqui por mim. Descansa”. Não é isso também um gesto de amor que poderíamos fazer nos casamentos?
E se pudéssemos dizer: “te amo, mas preciso ir. Porque honrar um amor que me fez crescer é também honrar meu direito de seguir crescendo, de alimentar novos sonhos, de ser aquela mulher ou aquele homem que encantou o outro pela coragem, pelo brilho no olho, pela capacidade de se reinventar
Como diz Vinicius de Moraes, “que não seja infinito, posto que é chama, mas que seja eterno enquanto dure”. E que não precisemos nos queimar para mantê-la acesa: uma chama faz sentido enquanto aquece; quando passa a consumir mais do que acolher, talvez seja cuidado permitir que se apague – para que algo em nós não mingue junto
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Fonte ==> Folha SP

