Reforma tributária e o setor de loteamentos: impactos, riscos e caminhos estratégicos – 07/08/2025 – Que imposto é esse

Reforma tributária e o setor de loteamentos: impactos, riscos e caminhos estratégicos - 07/08/2025 - Que imposto é esse

A reforma tributária aprovada pela Emenda Constitucional nº 132/2023 e regulamentada pela recém-promulgada Lei Complementar nº 214/2025 marca uma profunda transformação no sistema fiscal brasileiro. Embora traga inegáveis avanços em termos de simplificação e transparência, seus efeitos práticos variam amplamente entre os setores e, entre eles, o de loteamentos urbanos desponta como um dos mais impactados. O novo modelo tributário não apenas altera a lógica da arrecadação sobre o consumo, como também impõe desafios operacionais e estratégicos a um segmento essencial para o desenvolvimento urbano e o acesso à moradia.

A nova estrutura tributária concentra-se em dois tributos centrais: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com arrecadação compartilhada entre Estados, Distrito Federal e Municípios. A proposta, com algumas exceções, é substituir cinco tributos —ICMS, ISS, IPI, PIS e COFINS— por um sistema mais simples, baseado no princípio do destino: ou seja, a carga tributária incidirá no local de consumo, e não na origem do bem ou serviço. A estimativa preliminar para a alíquota total do novo IVA Dual varia entre 26,5% e 28%. No caso dos loteamentos, esse novo critério pode gerar distorções relevantes entre regiões produtoras de solo urbanizado e áreas de maior consumo.

Embora o discurso oficial da reforma reforce os ganhos com desburocratização e uniformização, seus efeitos práticos não serão sentidos de forma uniforme pelos diferentes setores da economia. E, no setor imobiliário, os impactos tendem a ser especialmente sensíveis, particularmente no segmento de loteamentos urbanos.

Estudos de entidades do mercado estimam que a carga tributária sobre operações de loteamento pode praticamente dobrar: dos atuais 6,65% para algo em torno de 13,25%. Trata-se de um dos aumentos proporcionais mais relevantes dentro do setor imobiliário, com potenciais reflexos sobre o preço final dos lotes e a oferta de novos empreendimentos. Esse acréscimo se deve, principalmente, à aplicação direta da alíquota cheia do IVA sobre a receita da venda dos lotes, excluído apenas o valor do terreno como base líquida de cálculo.

Além disso, o novo regime considera como contribuintes aqueles que venderem mais de três imóveis no ano anterior, adquiridos há menos de cinco anos; venderem mais de um imóvel construído por conta própria nos últimos cinco anos; ou alugarem mais de três imóveis distintos, com receita anual superior a R$ 240 mil. A Lei Complementar nº 214/2025 também institui um regime específico para o setor imobiliário, incluindo no rol de fatos geradores do IVA: venda de imóveis (inclusive lotes), locações onerosas, administração imobiliária, permutas e construção civil.

Diante dessa nova realidade, o legislador introduziu mecanismos compensatórios para mitigar os efeitos da transição. Entre eles, destaca-se o redutor de 50% da alíquota nas operações de venda e permuta onerosa de bens imóveis, e o redutor de 70% para locações e cessões onerosas. Também foram criados o redutor fiscal, aplicável a estoques adquiridos ou produzidos sob o regime anterior, e o redutor social, que permite a dedução de até R$ 100 mil da base de cálculo do IVA em unidades residenciais novas, lotes urbanos de menor valor e locações de interesse social.

Mas, ainda que esses mecanismos tragam algum alívio, eles não eliminam o desafio estrutural que se impõe ao setor de loteamentos. O aumento expressivo da carga pode impactar diretamente o valor final dos imóveis, as margens de lucro praticáveis e, sobretudo, a viabilidade de muitos empreendimentos.

Mais do que nunca, será necessário alinhar estratégia tributária, jurídica e operacional. A reforma demanda uma releitura profunda de conceitos tradicionais do Direito Tributário, como base de cálculo, não cumulatividade, fato gerador e seletividade, sob uma nova ótica sistêmica. E exige um diálogo constante com áreas como contabilidade, engenharia e administração para entender, de forma integrada, os seus efeitos.

Nesse cenário, o papel dos empreendedores e juristas será decisivo. A adaptação ao novo modelo fiscal não será apenas uma questão de conformidade normativa, mas de inteligência estratégica. Estar preparado significa antecipar os reflexos econômicos da reforma, repensar estruturas societárias, redesenhar contratos, avaliar riscos e buscar alternativas sustentáveis para preservar a competitividade do setor.

No caso dos loteamentos, isso significa não apenas manter a viabilidade econômica dos projetos, mas garantir a continuidade de um modelo de urbanização acessível, responsável e estruturante para milhares de municípios brasileiros. Em última análise, o sucesso dos empreendimentos de loteamento urbano no novo ambiente tributário dependerá da capacidade de transformar complexidade em oportunidade. A reforma não será apenas um marco legislativo, será um divisor de águas. E como todo processo de transformação profunda, exigirá visão, maturidade institucional e uma atuação proativa de todos os agentes envolvidos.



Fonte ==> Folha SP

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *