Charlie Kirk fazia política do jeito certo – 12/09/2025 – Ezra Klein

A imagem mostra um memorial com velas acesas e flores. No centro, há uma foto emoldurada de um homem, identificado como Charlie Kirk, com datas de nascimento e falecimento. As velas são predominantemente vermelhas e brancas, e o ambiente parece ser noturno, com algumas luzes ao fundo.

A base de uma sociedade livre é a capacidade de participar da política sem medo de violência. Perder isso é arriscar perder tudo. Charlie Kirk —e sua família— acabaram de perder tudo. Como país, também estamos um passo mais perto de perder tudo.

Estamos nos aproximando disso há algum tempo. Em 2020, um plano para sequestrar Gretchen Whitmer, governadora de Michigan, foi frustrado pelo FBI. Em 2021, uma multidão invadiu o Capitólio em uma tentativa de anular o resultado da eleição, e bombas caseiras foram encontradas nas sedes dos comitês nacionais dos partidos Democrata e Republicano. Em 2022, um homem invadiu a casa de Nancy Pelosi, presidente da Câmara na época, com a intenção de sequestrá-la. Ela estava ausente, mas o invasor agrediu seu marido de 82 anos, Paul, com um martelo, fraturando seu crânio. Em 2024, Donald Trump quase foi assassinado. Nesse mesmo ano, Brian Thompson, CEO da UnitedHealthcare, foi assassinado.

Em 2025, coquetéis molotov foram lançados na casa do governador Josh Shapiro, da Pensilvânia, durante a Páscoa judaica. Melissa Hortman, ex-presidente da Câmara de Minnesota, e seu marido foram assassinados, e o senador estadual John Hoffman e sua esposa foram gravemente feridos por um atirador. E agora, na quarta-feira (10), Kirk, fundador do Turning Point USA, foi baleado durante um discurso na Universidade do Vale de Utah.

Você pode não gostar de muito do que Kirk acreditava, e a seguinte afirmação ainda é verdadeira: Kirk praticava política exatamente da maneira correta. Ele aparecia em universidades e conversava com qualquer pessoa disposta a falar com ele. Ele era um dos praticantes mais eficazes da persuasão desta era. Quando a esquerda pensava que seu domínio sobre os corações e mentes dos estudantes universitários era quase absoluto, Kirk aparecia repetidamente para quebrá-lo. Lentamente, depois de repente, ele conseguiu. Os eleitores em idade universitária mudaram drasticamente para a direita na eleição de 2024.

Isso não foi tudo obra de Kirk, mas ele foi fundamental para estabelecer as bases para isso. Eu não conhecia Kirk, e não sou a pessoa certa para fazer seu elogio fúnebre. Mas invejava o que ele construiu. O gosto pelo debate é uma virtude na democracia. O progressismo poderia usar mais da coragem e destemor dele. No episódio inaugural de seu podcast, o governador democrata da Califórnia, Gavin Newsom, recebeu Kirk, admitindo que seu filho era um grande fã. Que testemunho do projeto de Kirk.

Nas redes sociais, tenho visto principalmente reações decentes ao assassinato de Kirk. Há tristeza e choque tanto da esquerda quanto da direita. Mas vi duas formas de reação que são equivocadas, por mais compreensível que seja a raiva ou o horror que as provocou. Uma é uma tentativa, na esquerda, de vincular a morte de Kirk às suas opiniões —afinal, ele defendia a 2ª Emenda da Constituição americana (que garante o direito à posse e porte de armas)—, mesmo admitindo que isso significava aceitar mortes de inocentes. Outra está na direita, transformando o assassinato de Kirk em uma justificativa para uma guerra total, um incêndio do Reichstag dos nossos tempos.

Mas, como a lista acima revela, não existe um mundo em que a violência política se intensifique e fique contida apenas aos seus inimigos. Mesmo que isso fosse possível, ainda seria um mundo de horrores, uma sociedade que teria colapsado na forma mais irreversível de não liberdade.

A violência política é um vírus. É contagiosa. Já passamos por períodos neste país em que ela era endêmica. Nos anos 1960, houve os assassinatos de John F. Kennedy, Malcolm X, Martin Luther King Jr., Robert F. Kennedy e Medgar Evers. Nos anos 1970, George Wallace foi baleado por um aspirante a assassino, mas sobreviveu, e Gerald Ford enfrentou duas tentativas de assassinato em um mês. Em 1981, Ronald Reagan sobreviveu depois que a bala de John Hinckley Jr. ricocheteou em sua costela e perfurou seu pulmão. Esses assassinos e aspirantes a assassinos tinham motivos diferentes, políticas diferentes e níveis diferentes de estabilidade mental. Quando a violência política se torna imaginável, seja como ferramenta política ou como escada para a fama, ela começa a infectar hospedeiros indiscriminadamente.

A política americana tem lados. Não adianta fingir que não tem. Mas ambos os lados deveriam estar do mesmo lado de um projeto maior —todos nós, ou a maioria de nós, de qualquer forma, estamos tentando manter a viabilidade do experimento americano. Podemos conviver com a perda de uma eleição porque acreditamos na promessa da próxima eleição; podemos conviver com a perda de um argumento porque acreditamos que haverá outro argumento. A violência política coloca isso em perigo.

Kirk e eu estávamos em lados diferentes na maioria dos debates políticos. Estávamos do mesmo lado quanto à possibilidade contínua da política americana. Deveria ser um debate, não uma guerra; deveria ser vencido com palavras, não finalizado com balas. Eu queria que Kirk estivesse seguro por ele mesmo, mas também queria que ele estivesse seguro por mim e pelo bem do nosso projeto compartilhado maior. O mesmo vale para Shapiro, para Hoffman, para Hortman, para Thompson, para Trump, para Pelosi, para Whitmer. Ou todos estamos seguros ou nenhum de nós está.



Fonte ==> Folha SP

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