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Inteligência artificial deve ser como especialista

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Edição - IstoéNEGÓCIOS

Em meio à disputa pela liderança da inteligência artificial, a alemã DeepL afirma ter o melhor tradutor e modelo de linguagem do mundo.

Antes mesmo da febre iniciada pelo ChatGPT, da OpenAI, a empresa oferecia a inteligência artificial generativa em traduções.

Com a popularização da tecnologia pelas mãos dos concorrentes, o fundador e CEO, Jarek Kutylowski, afirma em entrevista à Folha de S.Paulo que seus clientes ficaram mais “educados” e conhecem agora o potencial da ferramenta.

“Tecnologicamente, acho que não foi uma revolução para nós. Muitas das redes neurais que já estávamos usando eram de certa forma semelhantes”, afirma.

O foco do DeepL é o público corporativo, multinacionais que precisam de tradução de documentos com precisão. Em expansão, a empresa chega ao Brasil nesta semana após ter iniciado as operações no México em 2023.

Além de tradutor para 30 línguas, o DeepL é um assistente de escrita em inglês e alemão.

Previsões da Growth Market Reports apontam que o setor cresce 14% ao ano, e deve chegar a US$ 1 bilhão em faturamento em 2028 no mundo.

Outros nomes no mercado de assistentes de escrita são Grammarly, LanguageTool e Hemingway, assim como o próprio ChatGPT e o Gemini, do Google, usados também como tradutores.

Uma pesquisa da Thomson Reuters feita com diretores de companhias em 2023, conhecidos como “C-Suite”, mostra que os maiores benefícios esperados com o avanço da inteligência artificial são: satisfação do cliente, transformação digital e aumento da eficiência.

Para Kutylowski, PhD em ciências da computação, ainda existe espaço para avançar na tecnologia de tradução e auxílio à escrita.

O formato, segundo ele, será o de uma inteligência artificial que funciona como um colega, alguém com quem você interage. “Muito do bom trabalho que podemos fazer como humanos é criado a partir de diálogos com os outros.”

PERGUNTA – Como a DeepL se posiciona em meio ao boom de serviços e empresas por que passa a inteligência artificial? Existe espaço para tantas iniciativas?

JAREK KUTYLOWSKI – De certa forma, há muitas soluções diferentes no mercado agora. Isso pode ser útil ou não.

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O feedback que estamos recebendo de nossos clientes é que eles estão lutando para obter uma melhor compreensão de qual dessas soluções faz sentido para eles.

Algumas delas são realmente valiosas. Mas algumas não tanto. Especialmente aquelas nas quais a IA é mais genérica, não realmente feita para um caso de uso específico. Isso não significa que a tecnologia em si não seja incrível. É sempre um ciclo. Primeiro a tecnologia vem e depois você procura pelas aplicações.

P. – Como os lançamentos em inteligência artificial de 2023 impactaram a DeepL?

JK – Houve obviamente muitas mudanças na DeepL no ano passado. Por causa de como o mercado reagiu aos lançamentos e como ele mudou. Estamos agora com clientes que estão muito mais cientes da IA como uma possibilidade. Mas também estão mais cientes dos desafios. Eles estão muito mais “educados” sobre a IA do que estavam há três anos.

Tecnologicamente, acho que não foi uma revolução para nós. Muitas das redes neurais que já estávamos usando antes eram de certa forma muito semelhantes. No entanto, também reformulamos nossa agenda de pesquisa.

P. – Além da tradução para 30 línguas, vocês oferecem um assistente de escrita apenas para inglês e alemão. Como essa tecnologia se encaixa no modelo de negócio?

JK – Como empresa, começamos com a parte de tradução. Então, ela é nosso negócio principal. Acho que oferecer também o produto DeepL Write foi uma sequência natural e lógica. Primeiro, há muitos usuários que não querem apenas traduzir e usar essa tradução automática. Há usuários que querem editá-la. E esses geralmente começam traduzindo um texto e depois o levam para melhorar a escrita.

Temos visto que a comunicação e um modo simples de escrita são muito importantes para nossos clientes. Então eles querem procurar uma solução que venha como uma plataforma combinada. Nosso plano é oferecer mais idiomas. Não estamos nos limitando ao inglês e alemão. Mas ainda não posso lhe dar uma data para o português, infelizmente.

P. – O sr. acredita que ainda há espaço para a IA se desenvolver em termos de auxiliar a escrita?

JK – Totalmente. Chegamos bastante longe, e se algum de nós olhasse há dez anos para a tecnologia disponível agora ficaríamos impressionados. Mas mesmo assim acho que há mais.

Acho que a IA ainda pode seguir na direção de trabalharmos com a tecnologia como se tivesse um tradutor humano ou um especialista em linguagem sentado ao seu lado, interagindo com você sempre que algo não estiver claro, fazendo perguntas, levando e trazendo para que você possa sempre obter o máximo de sua comunicação…

Muito do ótimo trabalho que podemos fazer como humanos é criado por meio de um diálogo. Sempre que você está escrevendo com um amigo ou colega, o trabalho sai melhor.

P. – No que ela pode melhorar?

JK – Acho que a IA pode melhorar em termos de interatividade e em termos de suas capacidades de entender todo o contexto, quem você é, por que está escrevendo isso, quais são suas preferências em termos de linguagem. Ainda há muito a fazer.

É sempre melhor dar ao DeepL o maior texto possível para traduzir. Porque a qualidade será sempre melhor assim, já que a IA saberá muito melhor sobre o que você está escrevendo.

Estamos trabalhando em soluções em que possamos incorporar ainda mais contexto nessa tradução, como informações sobre a empresa, conhecendo outros textos que você talvez tenha escrito.

No momento, a coisa mais importante é sempre dar o máximo de contexto possível. Dê um documento inteiro para traduzir. Dê um artigo inteiro em vez de apenas um parágrafo.

P. – Como o sr. vê o futuro da interação entre humanos e a inteligência artificial?

JK – A voz é uma tendência de interface, em vez do texto?

Acho que o texto provou ser o melhor método de entrada de dados. Quanto a Alexa e assistentes domésticos, acho que houve muita empolgação em torno dessa tecnologia. Acho que a maioria das grandes empresas de tecnologia já descontinuou suas soluções ou as priorizou menos. Esse tipo de interação não decolou realmente.

No entanto, para o caso específico da tradução, acho que a voz será importante. E estamos trabalhando ativamente em produtos nesse sentido.

A capacidade de traduzir ao vivo uma chamada do Zoom, especificamente no contexto empresarial, onde muitas vezes você tem clientes que vêm de um país diferente, onde muitas vezes você tem equipes de diferentes países… Acho que isso será importante.

É apenas uma questão de a tecnologia atingir um nível em que seja realmente capaz o suficiente para que realmente queiramos usá-la.

P., – Como o uso pessoal por indivíduos se encaixa na estratégia da empresa?

JK – Geralmente começamos com usuários utilizando em sua vida pessoal, que começaram a usar a ferramenta por conta própria, e vimos que esses usuários muitas vezes levam as ferramentas para suas empresas.

P. – Quais são as mudanças que seus clientes afirmam que os assistentes de escrita garantem?

JK – Olhando para nossos clientes, acho que dois padrões surgem. O primeiro é sua comunicação interna. Sempre numa empresa há problemas de comunicação.

Um exemplo disso é um cliente que tem sua pesquisa e desenvolvimento de carros no Japão, enquanto 80% do mercado está nos EUA, todos que estão vendendo esses carros estão nos EUA e eles precisam ter uma ligação boa entre esses países.

Essa linha de comunicação é extremamente importante para eles para construir o que o mercado realmente requer.

O segundo padrão que costumamos ver é a comunicação externa, com empresas criando materiais de marketing, documentação técnica para clientes… Temos grandes empresas que estão traduzindo todas as solicitações de suporte a partir do idioma dos seus clientes.

Tudo vai para o idioma que seus atendentes falam e depois volta novamente.

P. – Quais setores do Brasil devem ser mais interessados em contratar a tecnologia de vocês?

JK – Há um mercado amplo, mas empresas como escritórios de advocacia, consultorias.  Essas são como as primeiras aplicações que vemos. Serviços financeiros são também uma parte importante disso.

P. – O sr. acredita que o aprendizado de uma segunda língua permanecerá relevante no futuro?

JK – Acho que a relevância e o motivo pelo qual estamos aprendendo idiomas irão mudar, talvez no futuro ou talvez já estejam mudando agora. É como aprender cálculo básico e matemática na escola.

Você realmente não precisa mais fazer isso hoje porque tem uma calculadora que é muito melhor em números do que você, você tem o Excel. Ainda assim precisamos aprender para entender o mundo e entender o que está realmente acontecendo.

Acho que com idiomas isso é de certa forma semelhante, para treinar nossas mentes a escrever, a entender as diferenças entre culturas e entender as diferenças entre países e como estamos nos expressando, aprender idiomas será muito útil no futuro.

Imagine que você tem um parceiro que não fala português, ele ainda vai querer falar uma língua comum… No entanto, no contexto empresarial, especificamente nas formas muito específicas, acho que o valor de entender e falar idiomas vai diminuir um pouco porque haverá ótimas ferramentas.

RAIO-X

JAREK KUTYLOWSKY, 41

Fundador e CEO da DeepL, PhD em ciências da computação com foco em matemática. Nascido na Polônia, começou a programar com 10 anos de idade

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