Tarifas de Trump sobre aço e alumínio impactam Brasil

Tarifas de Trump sobre aço e alumínio impactam Brasil

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou no domingo (9) que irá aplicar uma tarifa de 25% às importações de aço e de 10% sobre as de alumínio. Ainda que analistas internacionais avaliem que a medida tenha como um de seus principais alvos a China, que atualmente produz mais aço e alumínio que todo o restante do mundo, as novas alíquotas também podem atingir em cheio a indústria brasileira.

Os EUA são, com folga, o principal destino do aço brasileiro. No ano passado, o Brasil exportou US$ 11,9 bilhões em ferro fundido, ferro e aço, dos quais US$ 5,7 bilhões – 48% do total – foram para o mercado norte-americano. O segundo maior cliente desses produtos, a China, comprou US$ 1,3 bilhão, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

Da perspectiva dos EUA, o Brasil foi o segundo mercado que mais enviou aço para o país, atrás somente do Canadá. Segundo o Instituto Americano de Ferro e Aço (AISI), com base em informações do governo americano, os Estados Unidos compraram 4,5 milhões de toneladas de aço brasileiro, um crescimento de 14% frente a 2023.

No caso do alumínio, os EUA foram o segundo principal destino dos embarques brasileiros, um total de US$ 267 milhões em 2024, ou cerca de 17% do total das exportações nacionais, que somaram US$ 1,6 bilhão. Ou seja, tanto no caso do aço quanto do alumínio, o comércio com os EUA é de grande importância para o Brasil.

Rodolpho Damasco, sócio e head do Private Offshore da Nomos Investimento, avalia que o impacto sobre a economia brasileira pode ser significativo. “O Brasil é um dos principais fornecedores de aço para os Estados Unidos, e essa barreira comercial pode prejudicar diretamente empresas como CSN, Usiminas e Vale, que dependem do mercado americano para escoar parte de sua produção”, analisou.

A Gerdau, por outro lado, tem operações nos EUA e pode ter menos impacto, devido à possibilidade de atender à demanda local sem depender de exportações. No entanto, ele avalia que empresas que não possuem essa estrutura precisam buscar novos mercados.

Além disso, talvez tenham que lidar com um possível excesso de oferta no mercado brasileiro e suas consequências. Sem o escoamento dos produtos para os Estados Unidos, preços e margens de lucro podem ser pressionadas, afetando produção e eventualmente o emprego no setor.

Os impactos no setor da siderurgia ainda poderiam levar a um efeito em cadeia na economia brasileira. “Se as exportações caírem, a produção pode desacelerar, afetando fornecedores, transportadoras e outros segmentos ligados à siderurgia e à mineração”, afirma Damasco, que considera o risco de que as tarifas americanas gerem tensões comerciais globais e represálias de outros países, “dificultando ainda mais o cenário para o Brasil”.

Mas há visões distintas sobre os potenciais impactos do tarifaço de Trump na economia brasileira. Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil e sócio da consultoria Barral M Jorge, afirma que, embora os EUA recebam um percentual grande de exportação do aço e do alumínio brasileiros, a maior parte da produção brasileira fica no mercado interno.

“Desde o outro governo Trump há restrições de cotas para exportação do Brasil aos Estados Unidos. Então, se você olhar as exportações dos últimos quatro anos, praticamente elas são as mesmas”, diz.

Ele avalia que 25% é uma tarifa muito alta, mas pondera que é preciso verificar quais serão as medidas de fato para estimar seus efeitos na economia brasileira. Até a publicação desta reportagem, o governo dos EUA não havia oficialmente anunciado ou detalhado as tarifas.

Para Arthur Pimentel, presidente do Conselho de Administração da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), os anúncios fazem parte de um jogo complexo de negociações de Trump para favorecer a economia de seu país.

“O que a gente vê é um tabuleiro de xadrez. As peças desse tabuleiro não são movimentadas no ‘querer fazer’, mas essencialmente no ‘poder fazer’. E ele sabe muito bem disso, ele sabe muito bem o que faz”, diz Pimentel.

Siderurgia brasileira também lida com redução de preços causada pela produção chinesa

Apesar do anúncio de alta nas tarifas, os Estados Unidos não são autossuficientes na produção de aço e alumínio, diz Barral. Assim, o aumento no custo de importação pode levar ao aumento dos preços internos e da inflação – um dos pontos mais criticados no governo do ex-presidente Joe Biden.

Os EUA já foram responsáveis por quase metade da produção mundial, em meados do século passado, mas acabaram sobrepujados pela China. O crescimento na produção do país asiático foi impulsionado, em grande parte, pelo setor de construção civil, devido à alta demanda de moradias pela população, entre outras obras.

No entanto, o setor cresceu além do devido. Segundo o jornal The New York Times, o país produziu moradias para 1,4 bilhão de pessoas e há imóveis vagos que poderiam abrigar outros 300 milhões. A superprodução levou a uma crise no setor e uma redução na construção. 

A necessidade de exportar os excedentes fez com que a China se tornasse um competidor de peso no mercado internacional. Já em 2019, Trump também aplicou uma taxação de 25% sobre o aço e de 10% sobre o alumínio para buscar aquecer esses setores da indústria americana.

O Brasil também sofreu os impactos do choque de oferta global causado pelos chineses e, agora, ainda precisa lidar com os riscos das tarifas extras de Trump.

Welber Barral afirma que os outros mercados estão muito ocupados pela produção asiática, principalmente da China. “Então é provável que o Brasil não consiga competir, a não ser nos mercados em que tem áreas de livre comércio. É o caso da Argentina, dos países da Mercosul e países da América Latina”, diz.

Governo Lula diz que só responderá diante de medidas concretas dos EUA

Ainda que não descarte que o Brasil sofra com possíveis tarifas, Arthur Pimentel avalia que o país age de forma correta ao escolher apenas se pronunciar diante de taxações efetivas. A postura contrasta com as primeiras declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na semana passada, ele afirmou que retaliaria caso Trump tarifasse o Brasil.

Na noite de domingo, a assessoria do MDIC afirmou que não se pronunciaria em relação às possíveis tarifas de Trump. Na manhã desta segunda-feira (10), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, desmentiu relatos de que o Brasil estaria preparando reações às tarifas de Trump, como uma taxação extra de empresas de tecnologia.

“O governo tomou uma decisão de só se manifestar oportunamente com base em decisões concretas, não em anúncios que podem ser mal interpretados ou revistos. Então, nós vamos aguardar decisão oficialmente antes de qualquer manifestação”, disse Haddad a jornalistas.

Na tarde desta segunda, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, também disse que o Brasil irá aguardar medidas concretas. E afirmou que os países têm 200 anos de relações comerciais, “uma colaboração mútua, é um ganha-ganha”.

Segundo ele, a disposição “é sempre a de colaboração, parceria e benefício das nossas populações”. Ele classificou a relação comercial entre Brasil e EUA como equilibrada, onde “quem tem mais competitividade consegue colocar mais e melhor os seus produtos”.

Da mesma forma, entidades representantes do setor do aço e do alumínio no país resolveram não se manifestar. A Gazeta do Povo entrou em contato com o Instituto Aço Brasil e com a Associação Brasileira de Alumínio para saber das possíveis consequências das tarifas, mas ambas responderam que não iriam se pronunciar até a indicação de medidas concretas pelo governo americano.

Discussão de acordo de cooperação seria sinal positivo para o Brasil

Apesar do clima de apreensão, Arthur Pimentel destaca que há sinalizações positivas do governo americano em relação ao estreitamento do comércio com o Brasil. Ele lembra que está marcada para o segundo semestre deste ano uma reunião de autoridades de ambos os países para discussão do Acordo de Comércio e Cooperação Econômica (Atec, na sigla em inglês).

O acordo foi assinado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda durante o primeiro mandato de Trump, com o objetivo de facilitar trâmites burocráticos nas trocas comerciais entre ambos os países. Em razão do Mercosul, o Brasil não poderia assinar tarifas diferenciadas com os EUA, mas é possível, por exemplo, reduzir barreiras, simplificar as questões alfandegárias, ampliar a prestação de serviços e investimentos.

Segundo Pimentel, o acordo demonstra uma boa vontade do governo dos EUA de zelar pelo bom relacionamento comercial. Para ele, assim como Trump utiliza a força comercial americana como ferramenta de persuasão nas negociações com Canadá e México, pode agir de forma semelhante com o Brasil.

Trump já abrandou suas próprias taxações ao aço e alumínio brasileiros

Nesse caso, a tendência seria de abrandamento das medidas ao longo do tempo. Não seria a primeira vez. Em 2019, o próprio Trump elevou as tarifas para o aço e o alumínio. Em dezembro daquele ano, durante seu primeiro mandato, o americano alegou que Brasil e Argentina, por meio da desvalorização de suas moedas, faziam mal ao produtor dos EUA.

“Brasil e Argentina estão promovendo desvalorização em massa de suas moedas, algo ruim para os nossos fazendeiros. Portanto, tendo efeito imediato, vou restaurar as tarifas sobre aço e alumínio que são importados pelos Estados Unidos desses países”, escreveu Trump em sua conta no então Twitter.

Naquele momento, as taxas eram de 0,9% para o aço e de 2% para o alumínio. Mas as negociações da diplomacia brasileira conseguiram reverter o cenário. O Brasil ficou isento da alta nas tarifas, mas enfrentou cotas que limitavam o envio dos produtos aos EUA. As restrições foram revertidas no governo de Joe Biden.

Welber Barral afirma que, nessa ocasião, os Estados Unidos abriram exceção para Canadá, México e depois para Ucrânia e para vários tipos de produto. “Então a gente tem que ver como é que eles vão reagir dessa vez também”, concluiu.



Fonte ==> UOL

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